Resultante da ignorância, o culto dos mortos entre os povos primitivos se espalhou pelas múltiplas Civilizações da antiguidade, gerando em consequência, lamentáveis processos de desregramento religioso, que derrapavam, quase sempre, em dolorosos conúbios obsessivos. Entidades primárias e viciosas, utilizando-se das paixões vigentes, exigiam selvagens sacrifícios de vidas humanas, que o tempo se encarregou de suprimir...
Os holocaustos desta e daquela natureza foram sofrendo variações por impositivos do progresso, até assumirem conceituação metafísica, transmudando a mecânica da forma para a essência do espírito sacrificial. Concomitantemente, estabeleceu-se o intercâmbio entre os dois mundos: o dos encarnados, e o dos desencarnados, que retornavam com as mesmas características da personalidade desenvolvida antes do túmulo, exteriorizando as emoções e as sensações compatíveis ao estado de evolução de cada um.
Nos santuários dos Templos, nas Escolas de iniciação, nos "Mistérios", os mortos sempre assumiram papel preponderante, traduzindo os desejos dos "deuses" - "deuses" que se faziam crer - conduzindo, não raro, em em consequência, o pensamento humano às nascentes da vida, e elucidando os enigmas do ser, as diretrizes dos destinos e os impositivos da dor...
Filósofos e heróis, conquistadores e reis, magos e sacerdotes do passado mantiveram, dessa forma, longo comércio com o Mundo Espiritual em inolvidáveis diálogos, dos quais ressumavam a essência da vida verdadeira, a imortalidade, a comunicabilidade e a reencarnação do Espírito...
Com Jesus, no entanto, os chamados mortos receberam o necessário respeito, ocupando o devido lugar. Seus encontros com os libertos da carne, mencionados no Evangelho, são memoráveis, inconfundíveis. E a ética decorrente desse convívio, vazada na elevação moral e na renúncia, no amor e na caridade, constitui, ainda hoje, a linha de equilíbrio e base de segurança para a vida.
Depois d'Ele, Allan Kardec, o Missionário francês, de Lyon, foi investido pelo Alto com a inapreciável condição de desvelar a vida além da sepultura, facultando o renascimento do Cristianismo nos espíritos e nos corações, e abrindo nobres ensanchas para o intercâmbio com as Esferas Espirituais.
Os próprios Imortais aquiesceram em elucidar os enigmas humanos com a divina permissão, ampliando enormemente os horizontes do entendimento sobre a vida imperecível, após o decesso orgânico. Porque a Terra necessitasse de inadiável despertamento para as realidades do Espírito, os Embaixadores dos Céus mergulharam no corpo e renasceram nos diversos campos do pensamento e da investigação, colaborando com tirocínio lúcidos e comprovações indubitáveis da continuidade da vida após a morte.
Luminares do Reino mantiveram comunhão com os homens, através da mediunidade dignificada, repetindo a mensagem do Cordeiro de Deus aos corações amargurados e contribuindo com farta cópia de revelações novas. Não mais a morte. Em toda a parte exulta a vida. Ninguém se aniquila na morte. Muda-se de estado vibratório sem que se opere mudança intrínseca naquele que é considerado morto.
Morrer é, também, reviver. Mortos estão, em realidade, aqueles que têm fechados os olhos para a vida e jazem anestesiados na ilusão, deambulando, em hipnose inditosa, entre viciações e engodos. Cada ser é, além do corpo, o que cultivou na indumentária carnal. Nem melhor nem pior do que era. As construções mentais, longamente atendidas, não se apagam dos painéis espirituais ao toque mágico da desencarnação, tampouco o culto da personalidade, os hábitos infelizes, se rompem de imediato, graças ao bisturi miraculoso da morte.
Morrer e viver nas vibrações materiais são contingências que dizem respeito a cada um. Por essa razão, em memória dos teus mortos queridos, que vivem, não lhes açules as paixões subalternas com oferendas de ordem material. Já não necessitam dos mimos enganadores nem das demonstrações exteriores do mundo da forma. Têm agora outro conceito, compreendem melhor o que foram, como poderiam e deveriam ter sido, e lamentam, se não souberam conduzir a experiência pelas nobres linhas da elevação moral.
Respeita-lhes a memória, mas desvincula-os das coisas transitórias. Ama-os, e liberta-os das evocações dolorosas do vaso carnal. Ajuda, através da tua valiosa dádiva de amor, os que se demoram ao teu lado experimentando aflições e desesperos. Transforma as flores débeis que logo fenecem em pães de esperança, que sustentarão vidas em quase extinção.
Apaga os círios de parca luminescência e acende a luz da caridade, pensando neles, para que as lâmpadas de misericórdia que coloques em outras vidas possam transformar-se em claridade sublime nas consciências deles. Mitiga a sede, diminui a fome, alfabetiza, enseja o medicamento, fomenta a concórdia, distribui a esperança, divulga a paz, recordando aqueles a quem amas e que partiram para o mais além, e chuvas de bênçãos cairão sobre eles, abençoando-te também.
Não os pranteies em desesperos, não os exaltes em qualidades que não possuem. Recorda-os na saudade e mantêm-nos na lembrança do carinho, sabendo por antecipação que um dia virá em que jornadearás, também, na direção desse Mundo em que eles se encontram, voltando a estar ao lado deles, sendo feliz outra vez.
E como dispões ainda de tempo para preparar a sua viagem de retorno à Pátria Espiritual, organiza-te emocionalmente, entregando tua vida à Providência Divina e vivendo de tal forma do corpo que, em chegando o momento da desencarnação, não te detenhas atado às mazelas nem às constrições do vasilhame carnal.
"Se alguém guardar a minha palavra, nunca, jamais, provará a morte." - João, 8-52
O respeito que aos mortos se consagra não é a matéria que o inspira; é, pela lembrança, o Espírito ausente quem o infunde. Cap. XXIII, ítem 8.
É inadmissível, que nos dias atuais, às vésperas do 3º milênio, quer através da imprensa escrita, falada e televisiva, vejamos "fiéis" de determinadas religiões desenvolverem verdadeiras batalhas contra profitentes de outras crenças. Alguns, para alcançarem seus objetivos - aniquilar o inimigo - não titubeiam em lançar mão dos argumentos mais descabidos, até mesmo da mentira, se necessário for. Aqui comigo penso: se os religiosos, que pregam o entendimento, o perdão e paz, agem dessa maneira, imaginem os demais ...
Não há nenhum constrangimento em que sejam expostas as mazelas do próximo nos programas de TV, para depois então, mostrar a "religião salvadora". A dor e os problemas das pessoas são tratados como "produtos" na busca de conversões, num "marketing" proselitista sem pudor nem antecedentes, verdadeiro comércio da fé.
É lamentável que os homens "ainda sejam tão crianças no entendimento", como no dizer de São Paulo, perdendo tempo com discussões improdutivas, que não conduzem a lugar algum. Esquecem-se, que mais importante do que o rótulo é o conteúdo; mais importante que as aparências, são as atitudes. Depois, cada um tem o direito - inclusive assegurado pela Constituição do nosso país -, no que diz respeito às crenças e cultos, de seguir o caminho que bem entender, de acreditar no que bem quiser.
Por uma questão de respeito à liberdade de pensamento, temos o dever de aceitar o posicionamento religioso dos outros; se não por isto, pelo menos por educação. Afinal, o preconceito e a discriminação já fizeram milhões e milhões de vítimas ao longo da história da humanidade.
A Idade Média ficou para trás, graças a Deus. Os tempos das "cruzadas" e da "santa inquisição", quando tentavam impor "verdades" à custa de ferro e fogo, fazem parte apenas de um período obscuro e lamentável da nossa historicidade.
Os habitantes da Terra, lá para o final do 3º milênio, custarão a acreditar que um dia, homens foram escravos de outros homens; que existiu segregação racial nos Estados Unidos, motivo de vergonha para a maior "democracia" do mundo; que uns, por terem nascidos judeus, foram perseguidos e dizimados pelo Reich alemão; que outros, por serem arábes, foram vistos com desconfiança; que na Irlanda, católicos e protestantes, travaram uma guerra secular, sangrenta e desumana, pela disputa do poder em nome do Cristo. E, que ainda se achavam civilizados ...
Chega! É preciso que alguém grite, chamando todos a uma profunda reflexão, revendo conceitos e valores. De que valeram - é bom que se pergunte - os exemplos de Jesus, Buda, Krisna, Francisco de Assis e tanto outros iluminados que passaram pela Terra? De que valeram os sacrifícios de Ghandi, Martin Luther King e outros que ofereceram voluntariamente a própria vida em nome dos direitos humanos, de uma sociedade mais justa e da paz? De que têm valido os ensinamentos vivos que nos foram legados por Albert Schweitzer (evangélico), Madre Teresa de Calcutá e Irmã Dulce (religiosas católicas) e por Chico Xavier (espírita), todos desenvolvendo incansáveis tarefas humanitárias?
Numa entrevista concedida à Revista Planeta, um dos grandes pensadores dos nossos dias, Frei Leonardo Boff, cita uma frase creditada ao Dalai Lama, líder espiritual do Tibet que, acredito, pode ser uma luz a clarear o entendimento dos religiosos ortodoxos: "A melhor religião é a que te faz melhor."
Entretanto, cada um quer ser dono da verdade, se possível, com exclusividade reconhecida. E, isso, convenhamos, é uma tola presunção de quem quer impor seus pontos de vista. Quem tenta convencer ao outro é aquele que ainda não conseguiu convencer a si mesmo.
Geralmente, os que já percorreram o caminho e já atingiram o objetivo, são serenos, justos, e neles, a humildade é um estado natural. Não criticam nem julgam, porque têm a consciência de que aqueles que vem atrás, mesmo tropeçando e caindo, também chegarão ao objetivo desejado, independente do caminho que tenham escolhido. Sabem, que a Luz não se impõe - é conquista de cada um.
Nem mesmo Jesus, em toda a sua sabedoria, quando questionado por Pilatos, se arriscou a definir a Verdade, preferindo silenciar. Talvez, porque a Verdade não deva ser conceituada, mas sim, vivenciada em toda a sua plenitude, através de uma busca incessante, de um constante caminhar, como no dizer de Sérgio de Souza Carvalho, em o Mestres da Terra: "O caminho dever ser percorrido e não discutido. A compreensão vem do fazer e não do falar:"
"Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" - afirmou Jesus - mas, não a definindo, deixou claro que cada um terá que encontrar sua própria Verdade, escolher sua trajetória particular para poder atingi-la. Assim, a coragem libertará o medroso; a cura libertará o doente; a educação libertará o ignorante; a reparação da falta libertará o criminoso; a esperança libertará o pessimista; a hulmidade libertará o orgulhoso e, desse modo, cada um encontrará a "sua verdade", ao seu modo, tempo e lugar. Portanto, ninguém tem o direito de querer "impor" a sua verdade - ou o que julga ser verdade -, a quem quer que seja.
Se ainda não somos sábios o suficiente para fazermos nossas as palavras de Sócrates, "Só sei que nada sei", ao menos sejamos educados, respeitando as convicções de cada um. É o mínimo exigido pelo bom senso.
Cidadão da eternidade, o homem convive, simultaneamente, com o mundo físico e o espiritual. Durante o sono, verifica-se a separação provisória entre a alma e o corpo. Enquanto este dorme, o Espírito semiliberto, envolto em seu corpo fluídico, ou perispírito, pode adentrar o mundo invisível, em excursão de aprendizagem ou em tarefa de ajuda aos mais necessitados nos dois planos da vida. Na morte, porém, a libertação é definitiva: a vida, no corpo espiritual, desabrocha intensa e livre, pois "semeado corpo animal, ressuscita corpo espiritual"(I Cor.15:44). Por outro lado, o nascimento na Terra é como uma morte para o Espírito: este é encerrado em um "túmulo de carne", no dizer de Léon Denis. O mesmo se infere do conselho de Jesus ao homem que queria segui-Lo: "A outro disse: - Segue-me". "Mas ele disse: - Senhor, permite-me que eu vá primeiro sepultar meu pai" - "Deixa que os mortos sepultem os seus mortos; quanto a ti, vai anunciar o reino de Deus"(Lc, IX:59-60) É evidente que Jesus não censurava a preocupação piedosa do filho: providenciar o sepultamento de seu pai. A lição que se infere dessa passagem evangélica é que a vida real, intensa e bela, é a vida espiritual, natural ao ser; havia, pois, urgência em proclamá-la. Toda morte é um renascimento: o despertar da vida em sua plenitude. Assim como morre a feia lagarta para surgir a borboleta multicor, assim também desagrega-se o invólucro material para libertar o Espírito que, em sua roupagem diáfana, flutua rumo ao verdadeiro lar, em busca de novos compromissos. No dia de Finados, uma multidão de pessoas comparece aos cemitérios, cumprindo a tradição do culto aos mortos. As necrópoles ficam em festa, numa profusão de flores e velas, com direito à cobertura da mídia. Respeitamos aquele que assim o fazem; no entanto somos levados a refletir sobre o fato à luz dos ensinamentos da Doutrina Espírita. Não é no silêncio frio das sepulturas que vamos encontrar os nossos entes queridos que partiram. Dos tristes despojos, muitas vezes, resta apenas pó. Não raro, os amores por que choramos e vamos procurar no cemitério estão ao nosso lado, velando por nós. Às vezes sofrem e perturbam-se, angustiados com o nosso sofrimento. Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec pergunta : (323) - "A visita ao túmulo proporciona mais satisfação ao Espírito do que uma prece feita em sua intenção? Obtém a seguinte resposta:" A visita ao túmulo é uma maneira de se manifestar que se pensa no Espírito ausente: é a exteriorização desse fato. Eu já vos disse que é a prece que santifica o ato de lembrar; pouco importa o lugar, se a lembrança é ditada pelo coração." Convocados pelo pensamento, os finados comparecem ao triste local, em atenção aos seus familiares e amigos que lá se encontram. Tal, porém, poderia ser feito no recesso do lar, quando, em demonstração de saudade e carinho, fosse-lhes oferecido um ramalhete de flores envolvidas pela cariciosa vibração de uma prece. |
No século V antes de Cristo a Grécia viveu seu esplendor como berço da civilização mediterrânea e até hoje, a Idade de Péricles é um marco desta cultura. Durante esse tempo, desenvolvia -se um conceito religioso que é tido como politeísta, contudo, que muito pouco diverge de certos regimes religiosos que se intitulam monoteístas.
A mitologia grega, influenciada pela cultura do Antigo Egito, apresenta de comum com o monoteísmo um deus único, supremo, chamado Zeus, que habitava o Olimpo – corte divina. – Presidia, reinava ou imperava posto que até hoje ainda não se escolheu ao certo o regime teocrático. De Zeus para Deus, uma simples troca de letra.
Acontece que tal corte divina ainda se compunha de outros áulicos que, por se tratar de entidade superiores, também eram considerados deuses no fito único de não os confundir com as criaturas humanas, estas mortais, aqueles com poderes menores que Zeus, obviamente, todavia, investidos de predicados superiores aos de uma vulga r criatura.
Nosso caso não é o de abordar especificamente a cultura helênica, contudo, sendo ela a base dos estudos teogônicos, forçosamente será o fundamento comparativo mais indicado. Assim, podemos dizer que também no monoteísmo existe muita seita com personagens divinificadas, como os santos para a Igreja Católica, etc., pequenos deuses em atributos semelhantes aos do Olimpo.
O Olimpo era o monte mais alto da Tessália, na Grécia, que os atenienses conheciam, e suficientemente inacessível para que nenhum homem o atingisse àquela época desprovida dos alpinistas atuais. Com isso, ninguém lá ia bisbilhotar suas intimidades, resguardando assim a privacidade do local para que nele se instalasse comodamente uma corte divina sem a impertinente curiosidade do indiscreto ser humano. Não havia lugar mais bem indicado para nele instalarem Zeus e sua corte.
O monte grego, pois, tornava -se indevassável de forma que lá poderia ser ficticiamente colocada qualquer coisa que ninguém iria verificar; salvo algumas cabras monteses, possivelmente atribuídas às cocheiras e criações divinais, só os pássaros das grandes alturas sobrevoavam a região.
Deve-se o conhecimento da teogonia às obras do poeta grego Hesíodo, traduzidas do idioma antigo por Ghérard para o francês.
A cultura grega era tanta e tão vasta que Roma, ao ocupar a península Ática, em vez de fazer valer sua cultura sobre os dominados, acabou -se curvando ante o valor dos subjugados e assimilou seus conhecimentos, nascendo, então, a nova fase intelectual do poderoso Império Romano; para não dizer que a cópia era fiel, resolveu traduzir os nomes dos diversos deuses ou compará-los: foi assim que Zeus foi assimilado a Júpiter, ou melhor, este último ganhou o mesmo status. E outros mais, pelo relacionamento, como Vênus e Afrodite, Marte e Ares, etc.
Acontece, todavia que o homem, na sua busca incessante, começa a atingir pontos até então inacessíveis geograficamente, dentre eles a morada dos deuses, desmascarando a lenda e a credulidade a seu respeito fazendo-as cair em descrédito. Tornava-se, pois, necessário encontrar urgentemente uma nova habitação para colocar as divindades adoradas pelos homens.
Enquanto isso, as fases de transição se sucedem; Roma continua imperando no ocidente; os sábios ensinos de Jesus começam a chegar da Galiléia trazidos pelos próprios soldados invasores. Parece que o destino daquele império poderoso é sempre o de ter que importar cultura e crença, pois seu povo, mergulhado em orgias e prazeres, nunca deu ao mundo uma capacidade intelectual filosófica marcante.
Primavam por grandes reis e guerreiros, dentre eles a hierarquia dos doze Césares, conquistadores até nas letras. Caio Júlio, o César intelectual da dinastia, descrito em um poema épico – De Belo Gálico – falando de suas conquistas. Todavia, Roma possuiu o maior tratado ou código de direito que é o exemplo, ainda hoje, para os de todo mundo.
Por essa época, já na era cristã, mais de um século após a vinda de Jesus à Terra (por volta do ano 140), nasce na Grécia, ainda a Grécia como berço das civilizações antigas, um sábio matemático e astrônomo chamado Clavdius Ptolomeus, o africano oriundo da Ptolemaida Hérmia – que, por vezes, é confundido com o Ptolomeu macedônio, fundador da dinastia dos lágidas e que deu uma série de reis egípcios, dentre eles Soter II, dito Ptolomeu X, contemporâneo do astrônomo.
A Ptolomeus deve-se o primeiro catálogo de estrelas, embora todo errado como tudo o que dele adveio. Apresenta a teoria geocêntrica do Universo que serviu aos cristãos para criar a lenda do Céu-Inferno-Purgatório. Estava novamente Deus colocado em outro “Olimpo”, desta feita bem mais inacessível que o do monte grego.
Estamos nos prendendo um pouco à História para mostrar como os dogmas e os conceitos religiosos sempre estiveram intimamente ligados à cultura e ao conhecimento de cada época na qual tenham sido implantados.
A “Almagesta”, tratado de Astronomia do sábio grego com o catálogo estelar e a teoria do geocentrismo, foi devidamente aprovada no ano de 150 D.C. pelo imperador romano Antonino Pio cuja importância histórica foi mais a de ter educado Marco Antônio para ser seu sucessor do que mesmo ter sancionado um tratado astronômico na dupla acepção da palavra.
Posto que aprovado pelo imperador todo poderoso das terras romanas, incluindo Grécia, colônias africanas e territórios europeus ocupados, o estudo de Ptolomeus passou a ser oficial e consagrado mais que qualquer bula papal para os católicos; por esse motivo, ficou estabelecido que a Terra seria o centro do Universo e no seu interior o fogo q ue brotava pelas bocas vulcânicas e que, segundo os religiosos, seria a labareda das penas eternas em substituição às terras ilhadas do Estige da mitologia grega.
Só faltava Caronte e sua barca num rio de lava vulcânica.
Por fora, como ainda não era devidamente conhecida, em vez da atmosfera, a suposição da existência de camadas envoltórias formando o éter (do grego: aithér – etéreo), e quanto mais distante do globo mais etéreo. Envolvendo tudo isso tinha o limbo – nome até hoje empregado para definir a periferia dos astros, quase em desuso, porém conservado para especificar a graduação dos transferidores, principalmente os dos aparelhos ópticos – local para onde os religiosos resolveram mandar as almas em tempo de espera e que não tinham o direito de entrar diretamente no Paraíso Celeste a fim de aguardarem seu julgamento.
E, finalmente externo a tudo, como envolvente máxima, a abóbada celeste de estrelas fixas, onde imperaria a paz e a tranqüilidade do Universo, morada ideal para se alojar o novo Deus substituto de Júpiter destituído de sua corte ou destronado com a queda da inviolabilidade de sua antiga residência.
A única diferença é que subtraíram a divindade dos demais deuses, no entanto eles continuaram a existir sob as mais diversas formas, como anjos, arcanjos, querubins, etc.
De qualquer forma, perdurava a idéia de um Deus único supremo com seu acompanhamento na corte celeste, respeitando-se já então militarmente influído pelos costumes romanos, os poderes e hierarquias das divindades.
O termo latino Deus, dei para diferenciar a nova autoridade religiosa de Júpiter, o deus do Olimpo, veio também do grego Théos por adaptação fonética ao idioma falado em Roma. Ainda, segundo Virgílio, “o guia” (vesperdeo).
Por essa época o império romano estava entregue a Constantino, o Grande (277 -337 d.C.) e representava, sem dúvida, a maior potência do ocidente pelo seu poderio bélico. Por influência de seus assessores, ele impôs a Igreja de Pedro aos seus domínios, como religião oficial do Estado; foi assim que o Cristianismo passou a ser praticado livremente e mais do que isto, como obrigação, somente que, educado sob os princípios pagãos, aquele Império só poderia se adaptar a conceitos vinculados aos moldes pagãos, tomando o nome de Igreja Romana.
O Cristianismo, como veremos adiante, por si, nada mais era do que o Mosaísmo readaptado pelos preceitos que Jesus legou em sua passagem e pelas interpretações que deles deram seus instituintes denominados evangelistas. De saída, sofreu sua primeira mutilação: a de ser imposto pela força e não pela razão.
A nova Igreja tomou força, arregimentou sociedades e, para melhor governar seus fiéis, adquiriu forma hierárquica. Apenas de Cristo – como passou a tratar Jesus –, derivara o nome, de resto, era a tirania e a opressão em estilo pagão muito ao gosto da moral ( mor, moris – costume) romana.
Este néo-cristianismo ressurgido adaptou o Ser Divino do Novo Testamento ao Ser Supremo do paganismo para que melhor pudesse ser compreendido, possuindo um aspecto humano – até barbas lhe impuseram – mesmo no caráter. E para dar mais ênfase ao Judaísmo transformado em Cristianismo, copiaram lendas das seitas asiáticas, sob influência do Hinduísmo, criando a idéia da santíssima trindade do Trimúrti – composto de Brahma, Vix’nu e Çiva – que, por adaptação de personalidades, transformou-se em Deus Pai incriado, Cristo Filho homem na Terra personificado por Jesus e a alma divina da Criação que é o Espírito Santo, amém!
Contudo, se verificarmos bem, veremos que são quatro e não três, a saber: Nosso Senhor – o Deus criador; Jesus – o filho amado, feito homem na carne; Cristo – o Krishna, guia supremo do planeta; completado pelo Espírito Santo (amém!). Confusão esta nascida da idéia de que a Terra, centro do Universo, seria a única preocupação de Deus, no caso, o próprio Cristo.
Estava assim resolvido o sério problema para deificar nosso Guia e não ferir as estruturas da época. E como os recursos da Astronomia de então eram parcos e não permitiam se desvendasse o céu, melhor escolha não houvera que colocar a nova morava divina e sua corte celeste ou celestial no ultra –limbo idealizado por Ptolomeus e que era assaz indevassável. Contudo, ainda nesta concepção perdura a ideia de que os poderes destes seres celestiais, quais deuses mitológicos, são supre mos e intangíveis pela capacidade humana; pode-se dizer que isto representa o reflexo de toda uma cultura marcante que perdurava e ainda perdura na imaginação do povo.
Copérnico (Nicklauss) o astrônomo polonês, com sua teoria heliocentrista (1501) e posteriormente Galileo Galilei, nascido em Piza (1564), com sua indiscreta luneta desvendando o cosmo e com o seu estudo de Mecânica Celeste (1609) reafirmando as teses heliocentristas vieram comprometer seriamente a cômoda situação estabelecida em face dos estudos ptolomaicos.
Tal como os alpinistas fizeram com a corte do Olimpo, desta feita, desalojaram a corte celeste do zimbório, deixando-a desabrigada e sem outro lugar apropriado para que se instalasse sem as curiosas observações humanas comprometedoras e destruidoras de dogmas, bem como pudesse se livrar do alcance da nova invenção – a luneta – do sábio italiano.
Ambos só não foram queimados vivos pela Santa Inquisição porque um desencarnou antes e outro, enclausurado, deixou-se desdizer sem nada contestar.
Apesar desse ato coercivo, a Igreja Cristã que adotara o cânone habitacional de Deus baseado nos estudos de Ptolomeus, teve que se reformular e, sabiamente, decidiu que Céu-Inferno-Purgatório seria meramente um estado de espírito da criatura, não sem antes punir ambos os hereges, como já foi dito.
Evidentemente, a idéia de que a condenação ao Céu ou ao Inferno seria um estado de espírito, não há que contestar, afastada a hipótese de penas eternas e bem-aventuranças supremas concedidas a critério de sacerdotes tão humanos como os fiéis.
E dessa forma, chegamos à Era atual: tem-se dito que o avanço da Ciência cada vez mais encurrala os dogmas religiosos. Engano tredo! Pois a religião é que tem sido a maior vítima dos cientistas, porque sempre estabeleceu seus critérios baseados nos parcos conhecimentos humanos, onde reside seu erro, tentando adaptar o conceito religioso a cada descoberta científica, como no caso do geocentrismo.
Para encobrir sobremodo a falta de conhecimentos, considerando -se que a Religião não poderia ser falha, já que emana diretamente de Deus, a solução foi admitirem os dogmas: verdades que não se discutem.
Nossa Ciência está muito longe da Verdade Universal e, por isso, induz sua rival e companheira no erro; assim, ao criar-se um dogma, ele passa a ser inconteste ante a falta de segurança e amparo que possa lhe dar o conhecimento humano sobre o qual venha a se estabelecer.
Só que Deus não se mete nessas questões. Apesar disso, Ele e sua corte encontram -se, no momento, sem residência; talvez esse seja o motivo, como saída, em criarem-Lhe novos atributos tornando-O onipresente, incriado e como tal, habitaria todo o Universo que é o seu corpo material; é Infinito e Perfeito, como tal, não se restringe a um Universo possivelmente finito.
E aí começam a surgir as incoerências.
Quanto à sua perfeição, Leibniz escreveu um tratado para justificar a criação de uma obra imperfeita e não conseguiu, ainda, convencer os filósofos laicos. Contudo, o que até então está deveras pegando, no conceito cristão, é o dogma da Santíssima Trindade: como revogá -lo sem modificar a situação divina de Jesus?
Surge, assim, um novo problema bem mais intrínseco do que a posição que Deus possa ocupar no Universo ou que mais: – será que todo esse cosmo foi criado exclusivamente para que se colocasse o homem (obra prima da Criação) num minúsculo planeta de um reduzido e insignificante sistema solar perdido em uma galáxia que longe está de ser a maior do espaço sideral? Será ainda, que, nesse infinito perdido na eternidade do Evo, não exista nenhum outro mundo habitado? Se for para dar esse privilégio exclusivamente ao homem por que não o colocar em um astro melhor?
E muitas outras perguntas e indagações relativas à Criação existem, que nem os dogmas da Religião nem a capacidade intelectiva da Ciência podem esclarecer, muito menos os devaneios filosóficos.
De fato: não podemos ser a obra prima de Deus!
Carlos Imbassahy – obra E.. Deus Existe?
Nem sempre divergência significa desunião. Se é verdade que as divergências ou discordâncias algumas vezes já comprometeram a união entre pessoas e grupos, não se deve dar a este fato a extensão de uma regra geral, pois é apenas um episódio discrepante. Onde há duas pessoas frente a frente sempre há o que ou em que discordar. Seria impossível a existência de um grupo humano, por menor que fosse, sem um pensamento discordante, sem uma opinião contrária a qualquer coisa. Entre dois amigos, como entre dois irmãos muito afins pode haver divergência frontal ou inconciliável em matéria política, religiosa, social etc., sem que haja qualquer “arranhão” na amizade. Discutem, discordam, assumem posições opostas, mas continuam unidos.
Justamente por isso e pelo que observo na vida cotidiana, não creio que seja necessário abafar as divergências ou evitar qualquer discussão, ainda que em termos altos, simplesmente para preservar a união de um grupo ou de uma coletividade inteira. Seria o caso, em última hipótese, de acabar de vez com o diálogo e adotar logo um tipo de vida conventual. O diálogo é uma necessidade, pois é dialogando que trocamos idéias e permutamos opiniões e experiências. Uma comunidade que não admite o diálogo está condenada, por si mesma, a ficar parada no tempo. Cada qual naturalmente deve preparar-se ou educar-se espiritualmente para discutir ou divergir sem prevenções ou ressentimentos. O fato de não concordarmos com a opinião de um companheiro neste ou naquele sentido ou de não adotarmos a linha de pensamento de uma instituição deve ser encarado com naturalidade, mas não deve servir de motivo (jamais!) para que mudemos a maneira de tratar ou viremos as costas a alguém. Seria o caso de perguntar: e onde está o Evangelho, que se prega a todo momento?... Como falar em Evangelho, que é humildade e amor, e fugir a um abraço sincero ou negar um aperto de mão por causa de uma divergência ou de um ponto de vista?
Então, não é a divergência aqui ou ali que porventura “cava o abismo da desunião”, é a incompreensão, o personalismo, o radicalismo do elemento humano em qualquer campo do pensamento. Já ouvi dizer mais de uma vez que os espíritas são desunidos por causa das divergências internas. Sinceramente, não acompanho este ponto de vista. Acho que não há propriamente desunião, mas apenas desencontro de idéias, fora dos pontos cardeais da Doutrina. Somos uma comunidade composta de gente emancipada e, por isso mesmo, o campo está sempre aberto ao estudo e à crítica. Certos observadores gostariam, por exemplo, que o Movimento Espírita fosse um “bloco maciço sem nenhuma nota fora do conjunto. É uma pretensão utópica, pois não há um movimento religioso, político ou lá o que seja sem alguma voz discordante, aqui ou ali.
Tomava-se como referência, até bem pouco tempo, a “unidade monolítica” da Igreja Católica. Unidade relativa, diga-se de passagem. E o que se vê hoje? O fracionamento cada vez mais acentuado. Os grupos conservadores, porque se batem pela manutenção da Igreja tradicional, estão enfrentado os grupos renovadores, partidários de modificações estruturais; grupos que querem a Igreja fora da política estão em conflito com os grupos que querem justamente uma Igreja participante no campo político. Há, portanto, demanda de alto a baixo, com programas de reforma na teologia, como na administração e na disciplina eclesiástica. Logo, a Igreja não oferece hoje a unidade doutrinária que nos apontam às vezes, como modelo. E o Protestantismo, que é outro grande movimento religioso, não se divide em denominações e seitas, com características diferentes entre si? Batistas, presbiterianos, adventistas, congregacionistas etc. Não desejo criticar procedimentos religiosos, pois todos os cultos são respeitáveis, mas estou anotando fatos.
Voltemo-nos para mais longe, fora da faixa ocidental, e lá está o Budismo, também um movimento expressivo. Não cabe, aqui, discutir se o Budismo é ou não religião. Seja como for, ocupa um espaço considerável, mas também se ramificou. Existe, hoje, pelo menos mais de uma escola budista. O Positivismo, que viera da França, teve muita força no Brasil, mas não se manteve íntegro, pois o grande bloco se desmembrou entre científicos e religiosos no século passado. Sobrevive, hoje, uma religião sem Deus, sem cogitação acerca da vida futura, mas um culto ritualizado, com sacerdócio.
Muitos discípulos de Augusto Comte não queriam, de forma alguma, que o Positivismo se transformasse em religião e, por isso, eram chamados de científicos, ao passo que muitos outros absorveram logo o Positivismo como Religião da Humanidade. E realmente implantaram um culto religioso no Apostolado Positivista. Logo, também o Positivismo não conseguiu sustentar um padrão uniforme.
O fenômeno que se observa no meio espírita é muito diferente.
Sempre houve divergências, mas não se quebrou a unidade doutrinária, que é fundamental. O Espiritismo continua a ser um só, inconfundível, não se dividiu em diversos espiritismos. Há, entre nós, opiniões discordantes em determinados aspectos, porém, os princípios são os mesmos, não se alteraram. Não formamos seitas nem correntes à parte, apesar das divergências. Então, não há motivo para que estejamos vendo desunião onde há simplesmente desacordo de idéias.
Fonte: Reformador – junho, 1989
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