Quinta-feira, 29 de Setembro de 2011
Sensações dos Espíritos (01)
Sofrem os Espíritos? Que sensações experimentam?
Tais questões nos são naturalmente dirigidas e vamos tentar resolvê-las. Inicialmente devemos dizer que, para isso, não nos contentamos com as respostas dos Espíritos. De certa maneira, através de numerosas observações, tivemos que considerar a sensação com o fato.
Em uma de nossas reuniões, pouco depois que São Luís nos transmitiu a bela dissertação sobre a avareza, inserida em nosso número do mês de fevereiro, um de nossos associados narrou o seguinte fato, a propósito dessa mesma dissertação.
“Estávamos ocupados de evocações numa pequena reunião de amigos quando se apresentou, inopinadamente e sem que o tivéssemos chamado, o Espírito de um homem que havíamos conhecido muito bem e que, quando vivo, poderia ter servido de modelo ao retrato do avarento, feito por São Luís: um desses homens que vivem miseravelmente no meio da fortuna e que se privavam, não pelos outros, mas para acumular sem proveito para ninguém. Era inverno, estávamos perto do fogo; de repente aquele Espírito lembrou-nos seu nome, no qual absolutamente não pensávamos, pedindo-nos permissão para vir, durante três dias, aquecer-se à nossa lareira, pois que sofria horrivelmente do frio que voluntariamente suportara durante a vida e que, por sua avareza, também fizera os outros suportar. Era um alívio que experimentaria, acrescentou, caso concordássemos com o pedido.”
Aquele Espírito, pois, experimentava penosa sensação de frio; mas, como a experimentava? Eis aí a dificuldade. A esse respeito dirigimos a São Luís as seguintes perguntas:
– Consentiríeis em dizer-nos como esse Espírito de avarento, que não tinha mais o corpo material, podia sentir frio e pedir para se aquecer?
Resp. – Podes representar os sofrimentos do Espírito pelos sofrimentos morais.
– Concebemos os sofrimentos morais, como pesares, remorsos, vergonha; mas o calor e o frio, a dor física, não são efeitos morais; experimentariam os Espíritos tais sensações?
Resp. – Tua alma sente frio? Não; mas tem consciência da sensação que age sobre o corpo.
– Disso parece resultar que esse Espírito de avarento não sentia um frio real, mas a lembrança da sensação do frio que havia suportado e essa lembrança, tida por ele como realidade, tornava-se um suplício.
Resp. – É mais ou menos isso. Fique bem entendido que há uma distinção, que compreendeis perfeitamente, entre a dor física e a dor moral; não se deve confundir o efeito com a causa.
– Se bem entendemos, poderíamos ao que nos parece, explicar as coisas do seguinte modo: O corpo é o instrumento da dor. Se não é a causa primeira desta é, pelo menos, a causa imediata. A alma tem a percepção da dor: essa percepção é o efeito. A lembrança que da dor a alma conserva pode ser muito penosa, mas não pode ter ação física. De fato, nem o frio, nem o calor são capazes de desorganizar os tecidos da alma, que não é susceptível de congelar-se, nem de queimar-se. Não vemos todos os dias a recordação ou a apreensão de um mal físico produzirem o efeito desse mal, como se real fosse? Não as vemos até causar a morte? Toda gente sabe que aqueles cujos membros foram amputados costumam sentir dor no membro que lhes falta. Certo que aí não está à sede, ou, sequer, o ponto de partida da dor. O que há, apenas, é que o cérebro guardou esta impressão. Lícito, portanto, será admitir-se que coisa análoga ocorra nos sofrimentos do Espírito após a morte. Essas reflexões são justas?
Resp. – Sim; mais tarde, porém, compreendereis melhor ainda. Esperai que novos fatos venham vos fornecer motivos de observação; deles tirareis conseqüências mais completas.
Isso se passava no começo de 1858; desde então, com efeito, um estudo mais aprofundado do períspirito, que desempenha um papel tão importante em todos os fenômenos espíritas, e do qual não se tinha ainda conhecimento; as aparições vaporosas ou tangíveis; o estado do Espírito no momento da morte; a idéia, tão freqüente no Espírito, de que ainda está vivo; o quadro tão impressionante dos suicidas, dos supliciados, das pessoas que se deixaram absorver pelos prazeres materiais e tantos outros fatos mais, vieram projetar nova luz sobre essa questão e ensejaram explicações, cujo resumo faremos aqui.
O períspirito é o laço que à matéria do corpo prende o Espírito, o qual o tira do meio ambiente, do fluido universal. Participa ao mesmo tempo da eletricidade, do fluido magnético e, até certo ponto, da matéria inerte. Poder-se-ia dizer que é a quintessência da matéria. É o princípio da vida orgânica, porém não o da vida intelectual, que reside no Espírito. É, além disso, o agente das sensações exteriores. No corpo, os órgãos, servindo-lhes de condutos, localizam essas sensações. Destruído o corpo, elas se tornam gerais. Daí o Espírito não dizer que sofre mais da cabeça do que dos pés, ou vice-versa. Não se confundam, porém, as sensações do períspirito, que se tornou independente, com as do corpo. Estas últimas só por termo de comparação as podemos tomar e não por analogia. Um excesso de calor ou de frio pode desorganizar os tecidos do corpo, mas não pode causar nenhum dano ao períspirito. Liberto do corpo, o Espírito pode sofrer, mas esse sofrimento não é corporal, embora não seja exclusivamente moral, como o remorso, pois que ele se queixa de frio e calor. Também não sofre mais no inverno do que no verão: temo-los visto atravessar chamas, sem experimentarem qualquer dor. Nenhuma impressão lhes causa, conseguintemente, a temperatura. A dor que sentem não é, pois, uma dor física propriamente dita: é um vago sentimento íntimo, que o próprio Espírito nem sempre compreende bem, precisamente porque a dor não se acha localizada e porque não a produzem agentes exteriores; é mais uma reminiscência do que uma realidade, reminiscência, porém, igualmente penosa. Algumas vezes, entretanto, há mais do que isso, como vamos ver.
Ensina-nos a experiência que, por ocasião da morte, o períspirito se desprende mais ou menos lentamente do corpo; que, durante os primeiros minutos depois da desencarnação, o Espírito não encontra explicação para a situação em que se acha. Crê não estar morto, por isso que se sente vivo; vê ao lado o corpo, sabe que lhe pertence, mas não compreende que esteja separado dele. Essa situação dura enquanto haja qualquer ligação entre o corpo e o períspirito. Que nos reportemos à evocação do suicida dos banhos da Samaritana que relatamos em nosso número do mês de junho. Como todos os outros, ele dizia: “Não, não estou morto.” E acrescentava: “No entanto, sinto os vermes a me corroerem.” Ora, indubitavelmente, os vermes não lhe roíam o períspirito e ainda menos o Espírito; roíam-lhe apenas o corpo. Como, porém, não era completa a separação do corpo e do períspirito, uma espécie de repercussão moral se produzia, transmitindo ao Espírito o que estava ocorrendo no corpo. Repercussão talvez não seja o termo próprio, porque pode induzir à suposição de um efeito muito material. Era antes a visão do que se passava com o corpo, ao qual ainda o conservava ligado o períspirito, o que lhe causava a ilusão, que ele tomava por realidade. Assim, pois, não haveria no caso uma reminiscência, porquanto ele não fora, em vida, roído pelos vermes: havia o sentimento de um fato da atualidade. Isto mostra que deduções se podem tirar dos fatos, quando atentamente observados.
Durante a vida, o corpo recebe impressões exteriores e as transmite ao Espírito por intermédio do períspirito, que constitui, provavelmente, o que se chama fluido nervoso. Uma vez morto, o corpo nada mais sente, por já não haver nele Espírito, nem períspirito. Este, desprendido do corpo, experimenta a sensação, porém, como já não lhe chega por um conduto limitado, ela se lhe torna geral. Ora, não sendo o períspirito, realmente, mais do que simples agente de transmissão, pois que no Espírito é que está à consciência, lógico será deduzir-se que, se pudesse existir períspirito sem Espírito, aquele nada sentiria exatamente como um corpo que morreu. Do mesmo modo, se o Espírito não tivesse períspirito, seria inacessível a toda e qualquer sensação dolorosa. É o que se dá com os Espíritos completamente purificados. Sabemos que quanto mais eles se purificam, tanto mais etérea se torna a essência do períspirito, donde se segue que a influência material diminui à medida que o Espírito progride, isto é, à medida que o próprio períspirito se torna menos grosseiro.
Mas, dir-se-á, desde que pelo períspirito é que as sensações agradáveis, da mesma forma que as desagradáveis, se transmitem ao Espírito, sendo o Espírito puro inacessível a umas, deve sê-lo igualmente às outras. Assim é, de fato, com relação às que provêm unicamente da influência da matéria que conhecemos. O som dos nossos instrumentos, o perfume das nossas flores nenhuma impressão lhe causam. Entretanto, ele experimenta sensações íntimas, de um encanto indefinível, das quais idéia alguma podemos formar, porque, a esse respeito, somos quais cegos de nascença diante da luz. Sabemos que isso é real; mas, por que meio se produz? Até lá não vai a nossa ciência. Sabemos que no Espírito há percepção, sensação, audição, visão; que essas faculdades são atributos do ser todo e não, como no homem, de uma parte apenas do ser; mas, de que modo ele as tem? Ignoramo-lo. Os próprios Espíritos nada nos podem informar sobre isso, por inadequada a nossa linguagem a exprimir idéias que não possuímos, do mesmo modo que numa população de cegos não haveria termos que exprimissem os efeitos da luz; o mesmo ocorre com respeito à língua dos selvagens, para traduzir idéias referentes às nossas artes, ciências e doutrinas filosóficas.
Dizendo que os Espíritos são inacessíveis à impressão da matéria que conhecemos, referimo-nos aos Espíritos muito elevados, cujo envoltório etéreo não encontra analogia neste mundo.
Outro tanto não acontece com os de períspirito mais denso, os quais percebem os nossos sons e odores, não, porém, apenas por uma parte limitada de suas individualidades, conforme lhes sucedia quando vivos. Pode-se dizer que, neles, as vibrações moleculares se fazem sentir em todo o ser e lhes chegam assim ao sensorium commune, que é o próprio Espírito, embora de modo diverso e talvez, também, dando uma impressão diferente, o que modifica a percepção. Eles ouvem o som da nossa voz, entretanto nos compreendem sem o auxílio da palavra, somente pela transmissão do pensamento. Em apoio do que dizemos há o fato de que essa penetração é tanto mais fácil quanto mais desmaterializado está o Espírito. Pelo que concerne à vista, essa, para o Espírito, independe da luz, qual a temos. A faculdade de ver é um atributo essencial da alma, para quem a obscuridade não existe. É, contudo, mais extensa, mais penetrante nas mais purificadas. A alma, ou o Espírito tem, pois, em si mesma, a faculdade de todas as percepções. Estas, na vida corpórea, se obliteram pela grosseria dos órgãos do corpo; na vida extracorpórea, se vão desanuviando, à proporção que o invólucro sem imaterial se eteriza.
Haurido no meio ambiente, esse invólucro varia de acordo com a natureza dos mundos. Ao passarem de um mundo a outro, os Espíritos mudam de envoltório, como nós mudamos de roupa, quando passamos do inverno ao verão, ou do pólo ao equador. Quando vêm visitar-nos, os mais elevados se revestem do períspirito terrestre e então suas percepções se produzem como no comum dos Espíritos. Todos, porém, assim os inferiores como os superiores, não ouvem, nem sentem, senão o que queiram ouvir ou sentir. Não possuindo órgãos sensitivos, eles podem, livremente, tornar ativas ou nulas suas percepções. Uma só coisa é obrigada a ouvir – os conselhos dos Espíritos bons. A vista, essa é sempre ativa; mas, eles podem fazer-se invisíveis uns aos outros. Conforme a categoria que ocupem, podem ocultar-se dos que lhes são inferiores, porém não dos que lhes são superiores. Nos primeiros instantes que se seguem à morte, a visão do Espírito é sempre turbada e confusa.
Aclara-se, à medida que ele se desprende, e pode alcançar a nitidez que tinha durante a vida terrena, independentemente da possibilidade de penetrar através dos corpos que nos são opacos. Quanto à sua extensão através do espaço infinito, no passado e no futuro, vai depender do grau de pureza e de elevação do Espírito.
Objetarão, talvez: toda esta teoria nada tem de tranqüilizadora. Pensávamos que, uma vez livres do nosso grosseiro envoltório, instrumento das nossas dores, não mais sofreríamos e eis que nos informais que ainda sofreremos. Desta ou daquela forma, será sempre sofrimento. Ah! Sim, pode dar-se que continuemos a sofrer, e muito, e por longo tempo, mas também que deixemos de sofrer, até mesmo desde o instante em que se nos acabe a vida corporal.
Os sofrimentos deste mundo independem, algumas vezes, de nós; muito mais vezes, contudo, são devidos à nossa vontade. Remonte cada um à origem deles e verá que a maior parte de tais sofrimentos são efeitos de causas que lhe teria sido possível evitar. Quantos males, quantas enfermidades não deve o homem aos seus excessos, à sua ambição, numa palavra: às suas paixões? Aquele que sempre vivesse com sobriedade, que de nada abusasse, que fosse sempre simples nos gostos e modesto nos desejos, a muitas tribulações se forraria. O mesmo se dá com o Espírito. Os sofrimentos por que passa são sempre a conseqüência da maneira por que viveu na Terra. Certo já não sofrerá de gota, nem de reumatismo; no entanto, experimentará outros sofrimentos que nada ficam a dever àqueles. Vimos que seu sofrer resulta dos laços que ainda o prendem à matéria; que quanto mais livre estiver da influência desta, ou por outra, quanto mais desmaterializado se achar, menos dolorosas sensações experimentará. Ora, está nas suas mãos libertar-se de tal influência desde a vida atual. Ele tem o livre-arbítrio, tem, por conseguinte, a faculdade de escolha entre o fazer e o não fazer. Dome suas paixões animais; não alimente ódio, nem inveja, nem ciúme, nem orgulho; não se deixe dominar pelo egoísmo; purifique-se, nutrindo bons sentimentos; pratique o bem; não ligue às coisas deste mundo importância que não merecem; e, então, embora revestido do invólucro corporal, já estará depurado, já estará liberto do jugo da matéria e, quando deixar esse invólucro, não mais lhe sofrerá a influência. Nenhuma recordação dolorosa lhe advirá dos sofrimentos físicos que haja padecido; nenhuma impressão desagradável eles lhe deixarão, porque apenas terão atingido o corpo e não a alma. Sentir-se-á feliz por se haver libertado deles e a paz da sua consciência o isentará de qualquer sofrimento moral.
Interrogamos, aos milhares, Espíritos que na Terra pertenceram a todas as classes da sociedade, ocuparam todas as posições sociais; estudamo-los em todos os períodos da vida espírita, a partir do momento em que abandonaram o corpo; acompanhamo-los passo a passo na vida de além-túmulo, para observar as mudanças que se operavam neles, nas usas idéias, nos seus sentimentos e, sob esse aspecto, não foram os que aqui se encontraram entre os homens mais vulgares os que nos proporcionaram menos preciosos elementos de estudo. Ora, notamos sempre que os sofrimentos guardavam relação com o proceder que eles tiveram e cujas conseqüências experimentavam; que a outra vida é fonte de inefável ventura para os que seguiram o bom caminho. Deduz-se daí que, aos que sofrem isso acontece porque quiseram; que, portanto, só de si mesmos devem queixar-se, quer neste, quer no outro mundo.
Certos críticos ridicularizaram algumas de nossas evocações, por exemplo, a do assassino Lemaire, achando singular que nos ocupássemos de seres assim tão ignóbeis, quando temos tantos Espíritos superiores à nossa disposição. Esquecem que é justamente por isso que, de alguma sorte, apreendemos a natureza do fato, ou, melhor dizendo, em sua ignorância da ciência espírita eles não vêem nesses diálogos senão uma conversa divertida, da qual não compreendem o alcance. Lemos em algum lugar que um filósofo dizia, depois de se entreter com um camponês: “Aprendi muito mais com este homem simplório do que com todos os sábios.” É que ele era capaz de perceber algo além da superfície. Para o observador nada é perdido, encontrando ensinamentos até mesmo no criptógamo que cresce no adubo. Recusa-se o médico a tocar numa ferida horrenda, quando se trata de aprofundar a causa do mal?
Acrescentemos ainda uma palavra sobre o assunto. Os sofrimentos de além-túmulo têm um termo; sabemos que ao mais inferior dos Espíritos é dado o ensejo de elevar-se e purificar-se através de novas provas; isso pode ser demorado, muito demorado, mas depende de cada um abreviar esse tempo penoso, porquanto Deus o escuta sempre, desde que se submeta à sua vontade. Quanto mais desmaterializado é o Espírito, tanto mais vastas e lúcidas são as suas percepções; quanto mais está sob o domínio da matéria, o que depende inteiramente de seu gênero de vida terrestre, mais elas serão limitadas e veladas; quanto mais à visão moral de um se estende para o infinito, tanto mais restrita é a do outro. Os Espíritos inferiores têm apenas uma noção vaga, confusa, incompleta e muitas vezes nula do futuro; como não vislumbram o termo de seus sofrimentos, acreditam que sofrerão sempre, o que, para eles, ainda é um castigo. Se a posição de uns é aflitiva, terrível mesmo, não é, por isso, desesperadora; a dos outros é eminentemente consoladora. Cabe, pois, a nós escolher: isto é da mais elevada moralidade. Os cépticos duvidam da sorte que nos aguarda após a morte; nós lhes mostramos o que há, acreditando ter-lhes prestado um serviço. Assim, vimos mais de um deles recuar de seu erro ou, pelo menos, refletir sobre aquilo que antes censurava. Nada como nos darmos conta da possibilidade das coisas. Se tivesse sido sempre assim, não haveria tantos incrédulos e a religião e a moral só teria a ganhar. Entre muitos, a dúvida religiosa não procede senão da dificuldade que têm em compreender certas coisas; são Espíritos positivos, não organizados para a fé cega, que só admitem aquilo que, para eles, tem uma razão de ser. Tornai as coisas acessíveis à sua inteligência e eles as aceitarão, porque, no fundo, não pedem mais do que isso para crerem, e porque a dúvida lhes é uma situação mais penosa do que imaginamos e do que eles gostariam de admitir.
De tudo o que foi dito não há absolutamente um sistema, nem idéias pessoais; nem mesmo foram alguns Espíritos privilegiados que nos ditaram essa teoria: trata-se do resultado de estudos feitos sobre as individualidades, corroborados e confirmados pelos Espíritos, cuja linguagem não pode deixar dúvida sobre sua superioridade. Julgamo-los por suas palavras, e não pelo nome que carregam ou que se podem atribuir.
REVISTA ESPÍRITA, dezembro de 1858.
(01) N. do T.: Vide O Livro dos Espíritos – Livro II – capítulo VI – item 257: Ensaio teórico sobre a sensação dos Espíritos.
Quarta-feira, 28 de Setembro de 2011
Há dias que parecem não ter sido feitos para ti.
Amontoam-se tantas dificuldades, inúmeras frustrações e incontáveis aborrecimentos, que chegas a pensar que conduzes o globo do mundo sobre os ombros dilacerados.
Desde cedo, ao te ergueres do leito, pela manhã, encontras a indisposição moral do companheiro ou da companheira, que te arremessa todos os espinhos que o mau humor conseguiu acumular ao longo da noite.
Sentes o travo do fel despejado em tua alma, mas crês que tudo se modificará nos momentos seguintes.
Sais à rua, para atender a esse ou àquele compromisso cotidiano, e te defrontas com a agrestia de muitos que manejam veículos nas vias públicas e que os convertem em armas contra os outros; constatas o azedume do funcionário ou do balconista que te atende mal, ou vês o cinismo de negociantes que anseiam por te entregar produtos de má qualidade a preços exorbitantes, supondo-te imbecil. Mesmo assim, admites que, logo, tudo se alterará, melhorando as situações em torno.
Encontras-te com familiares ou pessoas amigas que te derramam sobre a mente todo o quadro dos problemas e tragédias que vivenciam, numa enxurrada de tormentos, perturbando a tua harmonia ainda frágil, embora não te permitam desabafar as tuas angústias, teus dramas ou tuas mágoas represadas na alma. Em tais circunstâncias, pensas que deves aguardar que essas pessoas se resolvam com a vida até um novo encontro.
São esses os dias em que as palavras que dizes recebem negativa interpretação, o carinho que ofereces é mal visto, tua simpatia parece mero interesse, tuas reservas são vistas como soberba ou má vontade. Se falas, ou se calas, desagradas.
Em dias assim, ainda quando te esforces por entender tudo e a todos, sofres muito e a costumeira tendência, nessas ocasiões, é a da vitimação automática, quando se passa a desenvolver sentimentos de auto piedade.
No entanto, esses dias infelizes pedem-nos vigilância e prece fervorosa, para que não nos percamos nesses cipoais de pensamentos, de sentimentos e de atitudes perturbadores.
São dias de avaliação, de testes impostos pelas regentes leis da vida terrena, desejosas de que te observes e verifiques tuas ações e reações à frente das mais diversas situações da existência.
Quando perceberes que muita coisa à tua volta passa a emitir um som desarmônico aos teus ouvidos; se notares que escolhendo direito ou esquerdo não escapas da ácida crítica, o teu dever será o de te ajustares ao bom senso. Instrui-te com as situações e acumula o aprendizado das horas, passando a observar bem melhor as circunstâncias que te cercam, para que melhor entendas, para que, enfim, evoluas.
Não te olvides de que ouvimos a voz do Mestre Nazareno, há distanciados dois milênios, a dizer-nos: No mundo só tereis aflições...
Conhecedores dessa realidade, abrindo a alma para compreender que a cada dia basta o seu mal..., tratarás de te recompor, caso tenhas te deixado ferir por tantos petardos, quando o ideal teria sido agir como o bambuzal diante da ventania. Curvar-se, deixar passar o vendaval, a fim de te reergueres com tranqüilidade, passado o momento difícil.
Há, de fato, dias difíceis, duros, caracterizando o teu estádio de provações indispensáveis ao teu processo de evolução. A ti, porém, caberá erguer a fronte buscando o rumo das estrelas formosas, que ao longe brilham, e agradecer a Deus por poderes afrontar tantos e difíceis desafios, mantendo-te firme, mesmo assim.
Nos dias difíceis da tua existência, procura não te entregares ao pessimismo, nem ao lodo do derrotismo, evitando alimentar todo e qualquer sentimento de culpa, que te inspirariam o abandono dos teus compromissos, o que seria teu gesto mais infeliz.
Põe-te de pé, perante quaisquer obstáculos, e sê fiel aos teus labores, aos deveres de aprender, servir e crescer, que te trouxeram novamente ao mundo terrestre.
Se lograres a superação suspirada, nesses dias sombrios para ti, terás vencido mais um embate no rol dos muitos combates que compõem a pauta da guerra em que a Terra se encontra engolfada.
Confia na ação e no poder da luz, que o Cristo representa, e segue com entusiasmo para a conquista de ti mesmo, guardando-te em equilíbrio, seja qual for ou como for cada um dos teus dias.
Sentes o travo do fel despejado em tua alma, mas crês que tudo se modificará nos momentos seguintes.
Sais à rua, para atender a esse ou àquele compromisso cotidiano, e te defrontas com a agrestia de muitos que manejam veículos nas vias públicas e que os convertem em armas contra os outros; constatas o azedume do funcionário ou do balconista que te atende mal, ou vês o cinismo de negociantes que anseiam por te entregar produtos de má qualidade a preços exorbitantes, supondo-te imbecil. Mesmo assim, admites que, logo, tudo se alterará, melhorando as situações em torno.
Encontras-te com familiares ou pessoas amigas que te derramam sobre a mente todo o quadro dos problemas e tragédias que vivenciam, numa enxurrada de tormentos, perturbando a tua harmonia ainda frágil, embora não te permitam desabafar as tuas angústias, teus dramas ou tuas mágoas represadas na alma. Em tais circunstâncias, pensas que deves aguardar que essas pessoas se resolvam com a vida até um novo encontro.
São esses os dias em que as palavras que dizes recebem negativa interpretação, o carinho que ofereces é mal visto, tua simpatia parece mero interesse, tuas reservas são vistas como soberba ou má vontade. Se falas, ou se calas, desagradas.
Em dias assim, ainda quando te esforces por entender tudo e a todos, sofres muito e a costumeira tendência, nessas ocasiões, é a da vitimação automática, quando se passa a desenvolver sentimentos de auto piedade.
No entanto, esses dias infelizes pedem-nos vigilância e prece fervorosa, para que não nos percamos nesses cipoais de pensamentos, de sentimentos e de atitudes perturbadores.
São dias de avaliação, de testes impostos pelas regentes leis da vida terrena, desejosas de que te observes e verifiques tuas ações e reações à frente das mais diversas situações da existência.
Quando perceberes que muita coisa à tua volta passa a emitir um som desarmônico aos teus ouvidos; se notares que escolhendo direito ou esquerdo não escapas da ácida crítica, o teu dever será o de te ajustares ao bom senso. Instrui-te com as situações e acumula o aprendizado das horas, passando a observar bem melhor as circunstâncias que te cercam, para que melhor entendas, para que, enfim, evoluas.
Não te olvides de que ouvimos a voz do Mestre Nazareno, há distanciados dois milênios, a dizer-nos: No mundo só tereis aflições...
Conhecedores dessa realidade, abrindo a alma para compreender que a cada dia basta o seu mal..., tratarás de te recompor, caso tenhas te deixado ferir por tantos petardos, quando o ideal teria sido agir como o bambuzal diante da ventania. Curvar-se, deixar passar o vendaval, a fim de te reergueres com tranqüilidade, passado o momento difícil.
Há, de fato, dias difíceis, duros, caracterizando o teu estádio de provações indispensáveis ao teu processo de evolução. A ti, porém, caberá erguer a fronte buscando o rumo das estrelas formosas, que ao longe brilham, e agradecer a Deus por poderes afrontar tantos e difíceis desafios, mantendo-te firme, mesmo assim.
Nos dias difíceis da tua existência, procura não te entregares ao pessimismo, nem ao lodo do derrotismo, evitando alimentar todo e qualquer sentimento de culpa, que te inspirariam o abandono dos teus compromissos, o que seria teu gesto mais infeliz.
Põe-te de pé, perante quaisquer obstáculos, e sê fiel aos teus labores, aos deveres de aprender, servir e crescer, que te trouxeram novamente ao mundo terrestre.
Se lograres a superação suspirada, nesses dias sombrios para ti, terás vencido mais um embate no rol dos muitos combates que compõem a pauta da guerra em que a Terra se encontra engolfada.
Confia na ação e no poder da luz, que o Cristo representa, e segue com entusiasmo para a conquista de ti mesmo, guardando-te em equilíbrio, seja qual for ou como for cada um dos teus dias.
Camilo Castelo Branco
Domingo, 25 de Setembro de 2011
"Meus filhos:
Que Jesus nos abençoe
A sociedade terrena vive, na atualidade, um grave momento mediúnico no qual, de forma inconsciente, dá-se o intercâmbio entre as duas esferas da vida. Entidades assinaladas pelo ódio, pelo ressentimento, e tomadas de amargura cobram daqueles algozes de ontem o pesado ônus da aflição que lhes tenham proporcionado. Espíritos nobres, voltados ao ideal de elevação humana sincronizam com as potências espirituais na edificação de um mundo melhor. As obsessões campeiam de forma pandêmica, confundindo-se com os transtornos psicopatológicos que trazem os processos afligentes e degenerativos.
Sucede que a Terra vivencia, neste período, a grande transição de mundo de provas e de expiações para mundo de regeneração.
Nunca houve tanta conquista da ciência e da tecnologia, e tanta hediondez do sentimento e das emoções. As glórias das conquistas do intelecto esmaecem diante do abismo da crueldade, da dissolução dos costumes, da perda da ética, e da decadência das conquistas da civilização e da cultura...
Não seja, pois, de estranhar que a dor, sob vários aspectos, espraia-se no planeta terrestre não apenas como látego mas, sobretudo, como convite à reflexão, como análise à transitoriedade do corpo, com o propósito de convocar as mentes e os corações para o ser espiritual que todos somos.
Fala-se sobre a tragédia do cotidiano com razão.
As ameaças de natureza sísmica, a cada momento tornam-se realidade tanto de um lado como de outro do planeta. O crime campeia a solta e a floração da juventude entrega-se, com exceções compreensíveis, ao abastardamento do caráter, às licenças morais e à agressividade.
Sucede, meus filhos, que as regiões de sofrimento profundo estão liberando seus hóspedes que ali ficaram, em cárcere privado, por muitos séculos e agora, na grande transição, recebem a oportunidade de voltarem-se para o bem ou de optar pela loucura a que se têm entregado. E esses, que teimosamente permanecem no mal, a benefício próprio e do planeta, irão ao exílio em orbes inferiores onde lapidarão a alma auxiliando os seus irmãos de natureza primitiva, como nos aconteceu no passado.
Por outro lado, os nobres promotores do progresso de todos os tempos passados também se reencarnam nesta hora para acelerar as conquistas, não só da inteligência e da tecnologia de ponta, mas também dos valores morais e espirituais. Ao lado deles, benfeitores de outra dimensão emboscam-se na matéria para se tornarem os grandes líderes e sensibilizarem esses verdugos da sociedade.
Aos médiuns cabe a grande tarefa de ser ponte entre as dores e as consolações. Aos dialogadores cabe a honrosa tarefa de ser, cada um deles, psicoterapeutas de desencarnados, contribuindo para a saúde geral. Enquanto os médiuns se entregam ao benefício caridoso com os irmãos em agonia, também têm as suas dores diminuídas, o seu fardo de provas amenizadas, as suas aflições contornadas, porque o amor é o grande mensageiro da misericórdia que dilui todos os impedimentos ao progresso – é o sol da vida, meus filhos, que dissolve a névoa da ignorância e que apaga a noite da impiedade.
Reencarnastes para contribuir em favor da Nova Era.
As vossas existências não aconteceram ao acaso, foram programadas.
Antes de mergulhardes na neblina carnal, lestes o programa que vos dizia respeito e o firmastes, dando o assentimento para as provas e as glórias estelares.
O Espiritismo é Jesus que volta de braços abertos, descrucificado, ressurreto e vivo, cantando a sinfonia gloriosa da solidariedade.
Dai-vos as mãos!
Que as diferenças opinativas sejam limadas e os ideais de concordância sejam praticados. Que, quaisquer pontos de objeção tornem‑se secundários diante das metas a alcançar.
Sabemos das vossas dores, porque também passamos pela Terra e compreendemos que a névoa da matéria empana o discernimento e, muitas vezes, dificulta a lógica necessária para a ação correta. Mas ficais atentos: tendes compromissos com Jesus...
Não é a primeira vez que vos comprometestes enganando, enganado-vos. Mas esta é a oportunidade final, optativa para a glória da imortalidade ou para a anestesia da ilusão.
Ser espírita é encontrar o tesouro da sabedoria.
Reconhecemos que na luta cotidiana, na disputa social e econômica, financeira e humana do ganha-pão, esvai-se o entusiasmo, diminui a alegria do serviço, mas se permanecerdes fiéis, orando com as antenas direcionadas ao Pai Todo-Amor, não vos faltarão a inspiração, o apoio, as forças morais para vos defenderdes das agressões do mal que muitas vezes vos alcança.
Tende coragem, meus filhos, unidos, porque somos os trabalhadores da última hora, e o nosso será o salário igual ao do jornaleiro do primeiro momento.
Cantemos a alegria de servir e, ao sairmos daqui, levemos impresso no relicário da alma tudo aquilo que ocorreu em nossa reunião de santas intenções: as dores mais variadas, os rebeldes, os ignorantes, os aflitos, os infelizes, e também a palavra gentil dos amigos que velam por todos nós.
Confiando em nosso Senhor Jesus Cristo, que nos delegou a honra de falar em Seu nome, e em Seu nome ensinar, curar, levantar o ânimo e construir um mundo novo, rogamos a Ele, nosso divino Benfeitor, que a todos nos abençoe e nos dê a Sua paz.
São os votos do servidor humílimo e paternal de sempre,
Bezerra."
Mensagem psicofônica de Bezerra de Menezes (espírito) transmitida por Divaldo Franco em 13.11.2010 – Los Angeles.
Sexta-feira, 23 de Setembro de 2011
Ritualismo religioso
Da Encyclopædia: ritualismo – nome dado à doutrina de Edward Bouverie Pusey (puseísmo) que surgiu por volta de 1850 em Oxford, movimento que se acentuou tendendo a restabelecer na prática da Igreja anglicana a observação dos principais ritos em uso na Igreja romana. Rito é sinônimo de culto, seita, ligado às religiões; é também normas de ritual.
Ritual (do latim: ritualis) é o livro que contém as cerimônias que se devam observar na administração dos sacramentos e durante a celebração do serviço divino. O termo se generalizou, por extensão, para definir o cerimonial a ser realizado em uma reunião social, distinguindo-as, de acordo com seus fins.
Cícero ainda nos fala do culto e das cerimônias consagradas aos deuses como religião.
Análise teonômica
Neste capítulo, sem dúvida, reside a diferença crucial entre as demais seitas e religiões que adotem um princípio teológico e a parte religiosa espírita, motivo pelo qual, muitos teóricos insistem em não aceitar a parte religiosa da codificação. Os principais tópicos serão analisados a seguir.
O Espiritismo:
– Não tem cultos religiosos.
– Não adora imagens nem consagra personalidades.
– Não admite qualquer tipo de infalibilidade, inclusive a mediúnica.
– Não pratica qualquer tipo de rituais.
– Não possui dogmas de fé nem admite mistérios.
– Não cultiva casta sacerdotal que exerçam a pregação doutrinária remunerada como meio de vida, nem possui missionários ou orientadores doutrinários específicos em sua pregação.
– Não adota o proselitismo nem a catequese.
– Respeita qualquer posição religiosa e não interfere em seus cultos.
– Não admite que as Entidades espirituais manifestas mediunicamente sejam aquinhoadas com qualquer forma de bens e ou utilidades materiais, muito menos bebidas, alimentos e imolações consagradas a elas.
– Não compactua com a fraude fenomênica.
– Não admite interesses pecuniários no exercício de qualquer atividade doutrinária, recomendando que seus adeptos, todos, tenham seus próprios meios de vida exercendo uma atividade profissional.
– Não possui templos religiosos.
– Coloca o estudo e a razão como condições doutrinárias precípuas.
– Não idolatra Deus nem venera Espíritos ou Entidades mentoras, ama-as, respeita-as e as admira sem cultuá-las como infalíveis ou santificadas. Nem admite infalibilidades.
Só os que não conhecem as obras de Allan Kardec é que são capazes de afirmar o contrário, pois o codificador da doutrina espírita não aceita qualquer envolvimento ritualístico, apesar de saber que o rito é íntimo nas criaturas, mas considera que seja um entrave ao seu progresso.
Muitos hão de se chocar com algumas ou até todas as negações; são os que ainda não se libertaram dos vínculos eclesiásticos e não se livraram do ranço de sua doutrinação. Não são capazes de resistir às verdades espíritas perante a coação religiosa imposta à nossa sociedade predominantemente católica durante tantos séculos.
Considerações
Façamos uma análise de cada caso.
– O culto a Deus está dentro de cada um e depende da forma pela qual Ele seja compreendido, já que, em verdade, os conhecimentos humanos estão infinitamente aquém da possibilidade de se imaginar como seja o Criador.
Nunca nos esqueçamos de que culto, aqui, refere-se à liturgia ou ofício divino, o ato e não o sentimento. O Espiritismo não possui missas de nenhuma natureza, logo, não possui culto. E ainda é bom se ter em mente que os próprios alfarrábios garantem que o culto a Deus é a ordem de cerimônias e preces determinadas pelas autoridades eclesiásticas competentes. Este será o caso do culto no lar (ou fora dele): cumprir determinações eclesiásticas. Convenhamos, um igrejismo inconfesso. Ressalve-se, pois, que muitos (no meio espírita) chamam erroneamente de culto no lar o que deveria ser “reunião no lar”.
E ainda cabe lembrar que Deus, por não ser humano, jamais está preocupado como que o homem possa pensar Dele; o importante é que suas sábias leis sejam cumpridas.
Como observação final, não se deve confundir o ato de cultuar memórias, lembranças amigas e recordações, etc., no sentido figurado do termo, com o aludido culto religioso.
– A liturgia – o termo advém do grego ( leitos – público; ergon – obra) e define como todos os dicionários indicam o serviço público de Deus, sua adoração e os ritos em seu louvor. Vai mais além quando afirma que os ritos públicos e serviços das Igrejas cristãs, principalmente os encontrados em missas ou cerimônias, englobam a eucaristia.
As liturgias diferem nas formas externas ou na invocação a Deus. No seu estudo, diferenciam-se os estilos distinguindo-se as que são praticadas pelos povos do oriente, quase todas muito parecidas com as que as Igrejas que adotaram a formação grega usam m. De permeio, encontra-se, ainda, a ritualística do Oriente Médio, que não sofre influências de nenhuma das duas clássicas liturgias.
Considerando que a Doutrina dos Espíritos não adota clérigos, que respeita o formalismo de cada um, que admite que a forma de compreender e sentir Deus é individualista, por certo não acolherá posições correlatas com o que se possa ter como cultos adotados de qualquer natureza e, portanto, liturgias.
Adoração de imagens – quanto à ideia de figuras tidas como sagradas, como totens e personalidades religiosas sacerdotais de qualquer natureza, não são admitidos numa doutrina em que o individualismo seja resguardado.
Não se justificam tais adorações pelo próprio posicionamento encarnacionista já que se sabe que nenhuma e qualquer imagem substitui a personalidade de quem represente, nem ali estarão suas radiações, já que se trata, apenas, de mero objeto figurativo.
Além disso, a adoração é injustificável.
Relativamente a sacerdotes, como o conceito é de que os mesmos sejam os representantes de Deus na Terra e como não possuam a respectiva credencial, sequer a capacidade de conhecer o Criador, não se justifica que se tenha neles a figura representativa de quem pudesse possuir tais privilégios, regalias ou poderes.
Entenda-se, porém, que isto não significa que tenhamos retratos de pessoas queridas em nossos salões, já que, apenas, o mesmo representa simples e singela lembrança do fotografado.
A infalibilidade – é outro ponto importante: só os fanáticos a admitem e esse tipo de paixão é cega e obsessiva, não tem acolhimento entre os que estudam e conhecem os ensinos espiríticos. O pior, é que se estende a qualquer coisa ou pessoa, incluindo médiuns e mensagens, patuás e superstições. Tudo, porém, deveria passar pelo crivo da análise; o simples fato de se ter recebido determinada comunicação de um desencarnado, no caso mediúnico mais afeito a nós, não significa que a mesma represente a verdade plena, primeiro, porque os Espíritos fora de um corpo continuam sendo os mesmos, com as mesmas características e idêntico saber ou conhecimento. Depois, porque não se pode garantir que o fenômeno tenha sido puro, sem influências mistificatórias indistintas. O que prevalece ainda é a razão.
Independentemente de fraudes, essas mensagens mediúnicas estão, ainda, sujeitas a inúmeras interferências e nem sempre acabam representado rigorosamente o que a Entidade manifestante pretendia transmitir. Tudo isso mostra que não existem infalibilidades. Só a Criação é perfeita.
Os rituais são mero formalismo; foram criados para impressionar o leigo e dar aos assistentes à ideia do transcendental. Provêm dos velhos cultos e do ritual primitivo.
As cerimônias religiosas como o batismo, casamento sacro, unção, missa, todos revestidos de ritualística, são perfeitamente dispensáveis e substituíveis por solenidades simples que visem à realização comemorativa dos eventos em causa sem a característica aparatosa, contemplativa e idólatra do culto sacerdotal.
Além disso, ninguém está credenciado para celebrar tais solenidades em nome de Deus, como seu representante. O que o Espiritismo combate é a crendice religiosa, o que nada tem que ver com as festividades simples, comemorativas desses eventos.
Dogma – outro ponto inaceitável, que é o estabelecimento pela fé e pela crença de princípios improváveis, o que será a negativa da razão. O dogma é sempre imposto e indiscutível, mostrando que não espelha a verdade porque esta, onde estiver, resistirá incólume a qualquer análise, sem temor de que possa ser desmascarada.
O mistério, principalmente divino, se mistério, ou seja, de causa desconhecida, tornando-se um enigma, pela própria definição, não pode ter aceitação porquanto ninguém será capaz de explicá-lo.
Nesse ponto, o Espiritismo segue a linha da Ciência: os pontos desconhecidos não são passíveis senão de estudos para averiguação e só podem se constituir em fato aceito quando forem devidamente esclarecidos ou provados.
A casta sacerdotal – é uma hierarquia terrena, estabelecida segundo os critérios de poder e escolha que nem sempre coincidem com o grau de adiantamento espiritual de seus componentes e só a evolução é que poderia definir as categorias, as patentes ou qualquer outra classificação de dependência, comando e subordinação no campo moral.
O simples fato de não se admitir o sacerdote, ou seja, o que se diga representante de Deus na Terra (ou detentor de seus poderes), por si, já eliminaria o critério de casta.
No lugar do sacerdote o Espiritismo adota o expositor, aquele que, com seus estudos e conhecimentos, esteja apto a transmitir para os demais companheiros de doutrina os ensinamentos que tenha adquirido.
Proselitismo – quanto a isto, cada qual deve seguir a linha de conduta que melhor lhe aprouver, levando em conta suas tendências, o que é válido para tudo, inclusive na linha doutrinária. Não adianta tornar-se adepto do Espiritismo, como uma grande parte faz, e continuar seguindo as linhas de sua antiga posição religiosa, ainda, querendo que os demais corroborem com isto. Não é o Espiritismo que deve se adaptar a seu seguidor.
Por esse motivo é que, no Espiritismo, há uma enorme diversidade de posicionamentos anômalos, alguns, até, condenados por Kardec. A tendência de cada um não pode ser contrariada. Esse é o mesmo motivo pelo qual não se recomenda a catequese, pois, cada qual só deve se tornar espírita depois de se inteirar dos seus critérios, aceitá-los pelo raciocínio e adotá-los conscientemente. Ainda aqui a razão.
O respeito – o Espiritismo não visa à competição nem pretende ser a única verdade a ser admitida, muito menos o único dos caminhos que levem a Deus e sua compreensão. Assim, é que respeita qualquer culto e os julga essenciais para atender aos afins. Cada qual é livre para praticá-los. O que não se aceita é tê-los como espíritas.
As oferendas – por outro lado, há inúmeras seitas que praticam o mediunismo e que, nessa prática, adotam ritualismo, oferendas e que mais. Elas não podem ser confundidas com a linha pregada por Kardec, mesmo que se arvorem em denominar-se como tal. Mediunismo não é Espiritismo, é apenas o lado fenomênico por ele estudado.
As Entidades espirituais que exigem oferendas, inclusive alimentos e bebidas, só o fazem para adquirir lastro a fim de que possam gravitar dentro da esfera terrena; são atrasados espiritualmente e necessitam desse recurso para que possam materializar seus instintos, só que essa prática lhes é prejudicial, motivo pelo qual não se deve atendê-las; quem o fizer, estará acarretando para si os mesmos problemas que irá causar a esses Espíritos.
Os desencarnados não necessitam disso nem deveriam usar as energias materiais para nada. Usam-na, todavia, para a prática de atos contrários à ética espírita.
Fraudes – muitos são os que, não só pelo resguardo doutrinário, como numa falsa ideia de caridade, acobertam os fraudadores. Kardec, em O Livro dos Médiuns (LM), foi categórico na condenação a tais pessoas que se dizem médiuns, mas que, por vaidade ou por vantagens pessoais, usam o processo da fraude para mistificar, enganando seus seguidores.
A falta de caridade está em permitir que tais falsos médiuns continuem praticando quais atitudes, dentro do erro que lhes irá trazer um lastro assaz pesado para encarnações vindouras. Basta lembrar que todos os enganados pelo mistificador terão que ser espiritualmente ressarcidos e isto representa sofrimento para aquele que fraudou, ou seja, o preço do resgate.
Sem dizer que a doutrina perde muito mais no acobertamento de tais fatos que, quando desmascara o enganador. E todo aquele que, sabendo da fraude, se deixar envolver por ela, por comodismo, por compactuação ou meramente por descaso, também responderá por cumplicidade perante o tribunal da sua consciência e será condenado por seu turno. É a lei.
Interesses pecuniários – o espírita não pode fazer da doutrina um meio de vida, afinal, ela representa o ensinamento dos Espíritos (que nada cobram por isso) e que não legaram a ninguém seu sacerdócio nem deram aos encarnados o direito de usarem seus recursos como forma de sustento. Cada qual, como encarnado, terá que possuir sua profissão, sujeitar-se ao trabalho terreno como os demais, lutar pela sobrevivência e não fazer, sob quaisquer aspectos, de seus conhecimentos e seus predicados, principalmente se mediúnicos, uma forma de facilitar sua vida pecuniária.
O esforço e a luta pela manutenção são parte do processo encarnatório. Contudo, não significa dizer que o espírita seja obrigado a gastar seus recursos, quando forem parcos, em detrimento do seu sustento, na pregação doutrinária. Auferir lucros é uma coisa; aceitar ajuda, sem que esta se trans forme em vantagem pessoal, para que possa levar sua mensagem a quem a solicite, é outra. Nem sempre um expositor tem condições financeiras de se deslocar para onde seja solicitado, o que permitirá que aceite o meio de transporte oferecido pelos companheiros.
Cobrar é que representa uma grave falha de caráter.
Templos – Os templos religiosos, embora, em sua imponência, sejam um veículo ideal para a pregação doutrinária, não fazem parte do Espiritismo. Qualquer lugar é local para uma reunião doutrinária, salvaguardados os casos de trabalhos mediúnicos.
No lugar de Igrejas e recintos arquitetônicos específicos, adota-se a Casa Espírita ou o Centro de reuniões, à semelhança de sociedades culturais que, evidentemente, têm que ser mantidas por seus participantes, sob forma agremiativa, comportando sócios mantenedores e uma diretoria por eles escolhida para administrá-las. Condena-se a perpetuidade do cargo, o que evita que novas ideias possam ser trazidas para a Sociedade, além de representar um vício social.
O vitalício é um vaidoso. A administração seguirá a ordem natural e legal de uma sociedade estabelecida, de modo que não desrespeite as leis do país.
É importante a existência do Centro espírita porque ele representa a reunião em comunidade e a Sociologia registra que o homem é, por excelência, um componente social. Entretanto, os estudos doutrinários – e não cultos religiosos – podem ser feitos em qualquer lugar, até mesmo em domicílio, no seio da família ou em reunião com amigos e companheiros.
A manutenção de costumes religiosos estranhos é um ranço que não pode existir no meio espírita sem profaná-lo; a liberdade de cada um e o respeito a ela é um direito de todos, porém, isso não permite que se chame de culto espírita àquilo que seja reminiscência de outras correntes filosóficas, até mesmo de práticas religiosas. Kardec condena esse culto de exteriorizações, por isso, não temos templos para ofícios religiosos.
A posição de Kardec – O estudo espírita, bem como o conhecimento da doutrina, são de vital importância aos seus praticantes. Sem isso, sem a razão e sem a independência para seguir a doutrina não se pode ser espírita. É um direito seu o de não se subjugar a outras correntes, mesmo predominantes e prepotentes.
Esta é a grande causa da confusão que existe no meio espírita, uns achando que a doutrina codificada por Kardec é uma religião, outros, tendo-a como um estudo filosófico científico de conclusões morais, enfim, uma diversificação total de opiniões. O pior de tudo é o uso de textos isolados que alguns empregam para justificar sua tese, principalmente os inimigos da trilogia, onde a terceira parte doutrinária seja a religiosa e que, chegam a ponto de cometerem a barbaridade de substituí-la pela moral que é um capítulo da sua parte filosófica.
Baseiam-se estes na definição que Kardec dera no seu livro “Qu’est-ce que le Spiritisme”, ao fim do preâmbulo, assim se expressando: – Le spiritisme est une science qui traite de la nature, de l’origine ET de la destinée des Esprits, et de leurs rapports avec le mond e corporel. (O Espiritismo é uma ciência que trata da natureza, da origem e do destino dos Espíritos e de seu intercâmbio com o mundo corpóreo) só que, se esquece de que, nesse mesmo livro (pág. 89 da 4ª ed.), o mesmo Kardec, respondendo a um padre, afirma:
– Si le spiritisme niait l’existence de Dieu, de l’âme, de son individualité et de son immortalité, dês peines et des récompenses futures du livre arbitre de l’homme. S’il enseignait que chacun n’est ici –bas que pour soi et ne doit penser qu’à soi, il s erait non seulement contraire à la religion catholique, mais à toutes les religions du monde; ... Loin de là; les Esprits proclament um Dieu unique souverainemente juste et bom; ils disent que l”homme est libre et responsable de ses ates, rémunéré ET puni selon le bien ou le mal qu’il a fait; ils placent au -dessus de toutes les vertus la charité évangélique, et cette règle sublime enseignée para le Christ: Agir envers les autres comme nous voudrions qu’on agît envers nous. Ne sont -ce pas lá les fondements de la religion?
Traduzindo: – Se o Espiritismo negasse a existência de Deus, da alma, de sua individualidade e de sua imortalidade, dos resgates e das recompensas futuras, do livre arbítrio do homem. Se ensinasse que cada um cuide si sem pensar nos demais, ele seria não apenas contrário ao catolicismo, mas a todas as religiões do mundo;... Ao contrário disso, os Espíritos proclamam um Deus único soberanamente justo e bom; dizem ainda que o homem é livre e responsável por seus atos, recompensado ou punido conforme o bem ou o mal que pratique; colocam acima de todas as virtudes a caridade evangélica e a regra sublime ensinada por Cristo: fazermos com os outros como queiramos que façam conosco. Não seriam esses os fundamentos da religião?
Mais explícito do isso, só se mandasse gravar um título em destaque garantindo que o Espiritismo contém uma parte religiosa. Só que os que desejam abolir esta faceta doutrinária, simplesmente ignoram tais declarações que emanam do próprio codificador. E depois de se ler esse texto, quem continuar negando a parte religiosa do Espiritismo está querendo ser mais realista do que o próprio rei.
A idolatria – é outro ponto polêmico que o Espiritismo combate; ela não representa nem o respeito, nem a admiração, muito menos a aceitação da existência de Deus como o grande Criador do Universo, nem dos idolatrados como dignos do respeito, senão do medo, até temor que têm dos mesmos. Coloca Deus na condição de simples humano, como predicados – que, para um Criador Supremo tornam-se defeitos – de poderes tais, competitivos com os nossos, que seja capaz de fazer o que bem entenda até mesmo o de contrariar suas próprias leis, identificando-se com a imperfeição.
Venerar vem do latim – venerari –, verbo que, segundo Plauto, significa adorar com submissão, reverenciar e, até mesmo, pedir com submissão. Cícero também empregou esse verbo com este sentido, lembrando que se trata de dedicação do homem aos deuses, no caso, romanos.
O espírita não pode, pelo simples fato de estar diante de uma Entidade, endeusá-la, venerando-a; pior, se for à própria Entidade a incentivadora, demonstrando com isso, que não se trata de nenhum luminar, senão um de enganador que se faça passar por orientador espiritual, geralmente, divertindo-se com isso.
Desses, devemos fugir, quando muito, evitar.
Nosso respeito, nossa admiração e até mesmo gratidão pela assistência que nossos mentores desencarnados nos dão, tudo isso deverá ter rigorosamente o mesmo tratamento como se estivéssemos ante um semelhante encarnado que nos preste ajuda e mereça o mais profundo afeto. Sempre lembrando, porém, que os sentimentos que dedicamos a terceiros, independente de situação, é uma questão de afinidade, afinidade essa que existe, até, numa substância química.
Apreciação final
O capítulo todo é muito delicado porque irá ferir susceptibilidades e contrariar aqueles que querem continuar praticando seus antigos cultos e fazer com que o Espiritismo os aceite.
Do mesmo modo que cada indivíduo deve ser respeitado em suas práticas e no seu direito de fazê-las, também ele deve respeito ao Espiritismo e suas normas evitando mesclar o purismo doutrinário com seus pontos de vista individuais.
Ninguém precisa mudar, contudo, ninguém deve alterar a doutrina para se auto realizar.
Carlos Imbassahy – obra E... Deus Existe?
Segunda-feira, 19 de Setembro de 2011
11 de agosto de 1935
É possível a estranheza dos que vivem na Terra, com respeito à atitude dos desencarnados, esmiuçando-lhes as questões e opinando sobre os problemas que os inquietam.
É lógico, porém, que os recém-libertos do mundo falem mais com o seu cabedal de experiências de passado, do que com a sua ciência do presente adquirida à custa de faculdades novas, que o homem não está ainda à altura de compreender.
Podem imaginar-se, na Terra, determinadas condições da vida sobre a superfície de Marte; mas que interessam, por enquanto, ao mundo semelhantes descobertas, se os enigmas que o assoberbam ainda não foram decifrados? Para o exilado da Terra não vale a psicologia do homem desencarnado. Tateando na prisão escura da sua vida, seria quase um crime aumentar-lhe as preocupações e ansiedades. Eu teria muitas coisas novas a dizer; todavia, apraz-me, com o objeto de me fazer compreendido, debruçar nas bordas do abismo em que andei vacilando, subjugado nos tormentos, perquirindo os seus logogrifos inextricáveis, para arrancar as lições da sua inutilidade.
Também o homem nada tolera que venha infringir o metro da sua rotina.
Presumindo-se rei da Criação, não admite as verdades novas que esfacelam a sua coroa de argila.
Os mortos, para serem reconhecidos, deverão tanger a tecla da mesma vida que abandonaram. Isso é intuitivo.
O jornalista, para alinhavar os argumentos da sua crônica, busca os noticiários, aproveita-se dos acontecimentos do dia, tirando a sua ilação das ocorrências do momento.
E meu espírito volve a contemplar o espetáculo angustioso dessa Abissínia abandonada no seio dos povos, como o derradeiro reduto da liberdade de uma raça infeliz, cobiçada pelo imperialismo do século, lembrando-me de Castro Alves nas suas amarguradas “Vozes da África":
Deus, Ó Deus, onde estás que não respondes?
Em que mundo, em que estrela tu te escondes,
Embuçado nos céus?
Há dois mil anos te mandei meu grito,
Que embalde, desde então, corre o infinito.
Onde estás, Senhor Deus?
Da Roma poderosa partem as caravanas de guerreiros. Cartago agoniza no seu desgraçado heroísmo. Públio Cornélio consegue a mais estrondosa das vitórias. Os cérebros dos patrícios ilustres embriagam-se no vinho do triunfo; e nas galeras suntuosas, onde as águias simbolizam ,o orgulhoso poder da Roma eterna, lamentam-se os escravos nos seus nefandos martírios.
Os Césares enchem a cidade das sabinas de troféus e glórias. Todos os deuses são venerados. Os países são submetidos e os povos entoam o hino da obediência à senhora do mundo.
Já não se ouve a melodiosa flauta de Pan nos bosques da Tessália, e nas margens do Nilo apagam-se as luzes dos mais suaves mistérios.
Vítima, porém, dos seus próprios excessos, o grande império vê apressar-se a sua decadência. No esboroamento dos séculos, a invencível potência dos Césares é um montão de ruínas. Sobre os seus mármores suntuosos crescem as destruições.
Roma dormiu o seu grande sono.
Ei-la, contudo, que desperta.
Mussolini deixa escapar um grito do seu peito de ferro e a Roma antiga acorda do letargo, reconhecendo a perda dos seus imensos domínios.
Urge, porém, recuperar o poderio, empenhando-se em alargar o seu império colonial.
Onde e como?
O mundo está cheio de leis, de tratados de amparo recíproco entre as nações.
A França já ocupou todos os territórios ao alcance das suas possibilidades, a Alemanha está fortificada para as suas aventuras, o Japão tem as suas vistas sobre a China e a Inglaterra, calculista e poderosa, não pode ceder um milímetro no terreno das suas conquistas.
Mas, Roma quer a expansão dá sua força econômica e prepara-se para roubar a derradeira ilusão de um povo desgraçado, ao qual não basta a lembrança amarga dos cativeiros multisseculares, julgando-se livre na obscura faixa de terra para onde recuou, batido pela crueldade das potências imperialistas.
Que mal fizeste à civilização corrompida dos brancos, ó pequena Abissínia, grande pela expressão resignada do teu ardente heroísmo?!
Como pudeste, das areias calcinantes do deserto, onde apuras o teu espírito de sacrifício, penetrar nas instituições européias, provocando a fúria das suas armas?
Deixa que passem sob o teu sol de fogo as hordas de vândalos, sedentas de chacina e de sangue.
Sobre as tuas esperanças malbaratadas derramará o Senhor o perfume da sua misericórdia.
Os humildes têm o seu dia de bem-aventurança e de glória.
Não importa sejas o joguete dos caprichos condenáveis dos teus verdugos, porque, sobre o mundo, todas as frontes orgulhosas desceram do pináculo da sua grandeza para o esterquilínio e para o pó.
Se tanto for preciso, recebe sobre os teus ombros a mortalha de sangue, porque, junto do maravilhoso império da Civilização apodrecida dos brancos, ouve-se a voz lamentosa de um novo Jeremias: - Oh! Jerusalém!... Jerusalém!...
Irmão X
Livro Crônicas de Além Túmulo
Segunda-feira, 12 de Setembro de 2011
PERGUNTA: Reconhecendo-se que os crimes do aborto provocado criminosamente surgem, em esmagadora maioria, nas classes mais responsáveis da comunidade terrestre, como identificar o trabalho expiatório que lhes diz respeito, se passam quase totalmente despercebidos da justiça humana?
RESPOSTA DE ANDRÉ LUIZ:
Temos no Plano Terrestre cada povo com seu código penal apropriado à evolução em que se encontra, mas, considerando o universo em sua totalidade como o Reino Divino, vamos encontrar o Bem do Criador para todas as criaturas, como Lei Básica, cujas transgressões deliberadas são corrigidas no próprio infrator, com o objetivo natural de conseguir-se, em cada círculo de trabalho no Campo Cósmico, o máximo de equilíbrio com o respeito máximo aos direitos alheios, dentro da mínima quota de pena.
Atendendo-se, no entanto, a que a Justiça Perfeita se eleva, indefectível, sobre o Perfeito Amor, no hausto de Deus "em que nos movemos e existimos", toda reparação, perante a Lei Básica a que nos reportamos, se realiza em termos de vida eterna e não segundo a vida fragmentária que conhecemos na encarnação humana, porquanto, uma existência pode estar repleta de acertos e desacertos, méritos e deméritos e a Misericórdia do Senhor preceitua, não que o delinqüente seja flagelado, com extensão indiscriminada de dor expiatória, o que seria volúpia de castigar nos tribunais do destino, invariavelmente regidos pela Equidade Soberana, mas sim que o mal seja suprimido de suas vítimas, com a possível redução de sofrimento.
Desse modo, segundo o princípio universal do Direito Cósmico e expressar-se, claro, nos ensinamentos de Jesus que manda conferir "a cada um de acordo com as próprias obras", arquivamos em nós as raízes do mal que acalentamos para extirpá-las à custa do esforço próprio, em companhia daqueles que se nos afinem à faixa de culpa, com os quais, perante a Justiça Eterna, os nossos débitos jazem associados.
À face de semelhante fundamentos, certa romagem na carne, entremeada de créditos e dívidas, pode terminar com aparências de regularidade irrepreensível para a alma que desencarna, sob o apreço dos que lhe comungam a experiência, seguindo-se de outra em que essa mesma criatura assuma a empreitada do resgate próprio, suportando nos ombros as conseqüências das culpas contraídas diante de Deus e de si mesma, afim de reabilitar-se ante a Harmonia Divina, caminhando, assim, transitoriamente, ao lado de espíritos incursos em regeneração da mesma espécie.
É dessa forma que a mulher e o homem, acumpliciados nas ocorrências do aborto delituoso, mas principalmente a mulher, cujo grau de responsabilidade nas faltas dessa natureza é muito maior, à frente da vida que ela prometeu honrar com nobreza, na maternidade sublime, desajustam as energias psicossomáticas, com mais penetrante desequilíbrio do centro genésico, implantando nos tecidos da própria alma a sementeira de males que frutescerão, mais tarde, em regime de produção a tempo certo.
Isso ocorre não somente porque o remorso se lhes entranhe no ser, à feição de víbora magnética, mas também porque assimilam, inevitavelmente, as vibrações de angústia e desespero e, por vezes, de revolta e vingança dos Espíritos que a Lei lhes reservara para filhos do próprio sangue, na obra de restauração do destino.
No homem, o resultado dessas ações aparece, quase sempre, em existência imediata àquela na qual se envolveu em compromissos desse jaez, na forma de moléstias testiculares, disendocrinias diversas, distúrbios mentais, com evidente obsessão por parte de forças invisíveis emanadas de entidades retardatárias que ainda encontram dificuldade para exculpar-lhes a deserção.
Nas mulheres, as derivações surgem extremamente mais graves. O aborto provocado, sem necessidade terapêutica, revela-se matematicamente seguido por choques traumáticos no corpo espiritual, tantas vezes quantas se repetir o delito de lesa-maternidade, mergulhando as mulheres que o perpetram em angústias indefiníveis, além da morte, de vez que, por mais extensas se lhe façam as gratificações e os obséquios do Espíritos Amigos e Benfeitores que lhe recordam as qualidades elogiáveis, mais se sentem diminuídas moralmente em si mesmas, com o centro genésico desordenado e infeliz, assim como alguém indebitamente admitido num festim brilhante, carregando uma chaga que a todo instante se denuncia.
Dessarte, ressurgem na vida física, externando gradativamente, na tessitura celular de que se revestem, a disfunção que podemos nomear como sendo a miopraxia do centro genésico atonizado, padecendo, logo que reconduzidas ao curso da maternidade terrestre, as toxemias da gestação.
Dilapidado o equilíbrio do centro referido, as células ciliadas, mucíparas e intercalares não dispõe da força precisa na mucosa tubária para a condução do óvulo na trajetória endossalpingeana, nem para alimentá-lo no impulso da migração por deficiência hormonal do ovário, determinando não apenas os fenômenos da prenhez ectópica ou localização heterotópica do ovo, mas também certos síndromes hemorrágicos de suma importância, decorrentes da nidação do ovo fora do endométrio ortotópico, ainda mesmo quando este já esteja acomodado na concha uterina, trazendo habitualmente os embaraços da placentação baixa ou a placenta prévia hemorragía para que constituem, na parturição, verdadeiro suplício para as mulheres portadoras do órgão germinal em desajuste.
Enquadradas na arritmia do centro genésico, outras alterações orgânicas aparecem, flagelando a vida feminina, , como sejam o descolamento da placenta eutópica, por hiperatividade histolítica da vilosidade corial; a hipocinesia uterina, favorecendo a germicultura do estreptococo ou do genococo, depois das crises endometríticas puerperais, a salpingite tuberculosa, a degeneração cística do cório; a salpigooforite, em que o edema e o exsudato fibrinosos provocam a aderência das pregas da mucosa tubária, preparando campo propício às grandes inflamações anexiais, em que o ovário e a trompa experimentam a formação de tumores purulentos que os identificam no mesmo processo de desagregação; os síndromes circulatórios da gravidez aparentemente normal, quando a mulher, no pretérito, viciou também o centro cardíaco, em conseqüência do aborto calculado e seguido por disritmia das forças psicossomáticas que regulam o eixo elétrico do coração, ressentindo-se, como resultado, na nova encarnação e em pleno surto de gravidez, da miopraxia do aparelho cardiovascular, com aumento da carga plasmática na corrente sanguínea, por deficiência no orçamento hormonal, daí resultando graves problemas da cardiopatia conseqüente.
Temos ainda a considerar que a mulher sintonizada com os deveres da maternidade na primeira ou, às vezes, até na segunda gestação, quando descamba para o aborto criminoso, na geração dos filhos posteriores, inocula, automaticamente no centro genésico e no centro esplênico do corpo espiritual as causas sutis de desequilíbrio recôndito, a se lhe evidenciarem na existência próxima pela vasta acumulação do antígeno que lhe imporá as divergências sanguíneas com que asfixia, gradativamente, através da hemólise, o rebento de amor que alberga carinhosamente no próprio seio, a partir da segunda ou terceira gestação, porque as enfermidades do corpo humano, como reflexos das depressões profundas da alma, ocorrem dentro de justos períodos etários.
Além dos sintomas que abordamos em sintética digressão na etiopatogenia das moléstias do órgão genital da mulher, surpreenderemos largo capítulo a ponderar no campo nervoso, à face da hiperexitação do centro cerebral, com inquietantes modificações da personalidade, a raiarem, muitas vezes, no martirológico da obsessão, devendo-se ainda salientar o caráter doloroso dos efeitos espirituais do aborto criminoso, para os ginecologistas e obstetras delinqüentes.
Para melhorar a própria situação, que deve fazer a mulher que se reconhece, na atualidade, com dívidas no aborto provocado, antecipando-se, desde agora, no trabalho de sua própria melhoria moral, antes que a próxima existência lhe imponha as aflições regenerativas?
ANDRÉ LUIZ:
Sabemos que é possível renovar o destino todos os dias. Quem ontem abandonou os próprios filhos pode hoje afeiçoar-se aos filhos alheios, necessitados de carinho e abnegação.
O próprio Evangelho do Senhor, na palavra do Apóstolo Pedro (I Pedro, 4:8), adverte-nos quanto à necessidade de cultivarmos ardente carinho uns para com os outros, porque a caridade cobre a multidão de nossos males.
Evolução em Dois Mundos, Parte II, caps. X e XI, André Luiz/Chico Xavier/Waldo Vieira, FEB)
Domingo, 11 de Setembro de 2011
Lucas 14:25-33
25 Saía com ele grande multidão e, voltando-se disse (Jesus) a eles:
26 "Se alguém vem a mim e não odeia seu pai, e a mãe, e a esposa, e os filhos, e os irmãos, e as irmãs, e até também a própria alma, não pode ser meu discípulo;
27 quem não carrega sua cruz e vem atrás de mim, não pode ser meu discípulo.
28 Quem de vós, pois, querendo edificar uma torre, primeiro não se senta a calcular o gasto, se tem para acabar?
29 Para que não suceda que, pondo o alicerce e não podendo terminar, os que vêem comecem a caçoar dele,
30 dizendo; "este homem começou a edificar e não pode terminar".
31 Ou que rei, saindo a lançar-se em guerra com outro rei, primeiro não senta, deliberando se é forte com dez mil, passa a enfrentar ao que vem com vinte mil contra ele?
32 Se não, estando ele ainda longe, envia uma legação, pedindo as (condições) para a paz
33 Assim, pois, qualquer de vós que não se destaca de todas as suas posses, não pode ser meu discípulo".
As "multidões" saíam, acompanhando Jesus, correndo atrás de Sua fascinante personalidade humana, maravilhadas com Seus poderes psíquicos, com Suas "palavras de amor" Luc. 4:22; vol. 2 pág. 49) , de sabedoria e autoridade. O Mestre observa os componentes do grupo: quantos ali estão a Ele se prendem somente por causa dos benefícios recebidos ou a receber... Não. Não é isso o que importa, não é isso que interessa. Não é imitá-Lo externamente, nas palavras e gestos. É algo mais profundo e misterioso.
Volta-se, então, e mais uma vez fala, repisando temas já versados outras ocasiões, a fim de fixar responsabilidades e alertar contra entusiasmos fáceis e efêmeros. Já expusera longamente, certa feita, as condições essenciais para ser Seu discípulo (cfr: Mat. 16:24-28; Marc. 8:34-38; Luc. 9:23:-27; vol. 4.o, pág. 64 ss).
Novamente frisa, com outras palavras, as condições indispensáveis para que possa alguém ingressar na senda do discipulado.
l.a - "odiar" (míseô) os parentes, por mais próximos e queridos que sejam, e cita: "pai, mãe, esposa, filhos (em geral, dos dois sexos, tékna), irmãos, irmãs. Em Mateus 10:37 (vol 3o., pág. 92), são citados: pai, mãe, filho, nora e filha. E pelas palavras aí registradas por esse evangelista, compreendemos o sentido deste "odiar". Lá encontra-se: ho philón patéra è météra hyper emé, isto é, "o que ama o pai ou a mãe acima de mim" (mais que a mim). Trata-se, portanto, de dois termos de comparação entre dois amores, levada ao extremo exagero por metáfora, devido à exuberância do linguajar oriental.
2.a - Não apenas os seres queridos "externos", mas até a própria alma (psychë), ou seja, sua personagem terrena. Em outro passo (Mat. 16:24; Marc. 8:34; Luc. 9.23; vol. 4o, pág. 64) essa exigência é dita com a expressão "negue-se a si mesmo". Então, desligamento total de amores personativos externos e internos.
3.a - Carregar sua cruz, já explicado no vol. 4.o pág. 65-66.
4.a - Caminhar após Ele (idem, ibidem).
5.a - Calcular sua capacidade. Exigência que pela vez primeira aparece. Ou seja, fazer o indispensável balanço no que possua de compreensão, de cultura intelectual, de conhecimento, para ver se tem possibilidade de iniciar e terminar o estudo e a "construção da torre".
6.a - Calcular suas possibilidades, isto é, as forças de que dispõe para enfrentar um adversário numeroso e ferrenho.
7.a - E última: destacar-se (o verbo grego apotássô é composto de tásso, "por no lugar devido", e apó, longe de"), ou seja, saber colocar nos devidos lugares, bem longe um do outro, o Espírito e os bens materiais (hypárchousin)...
Para esclarecer de vez o sentido do vers. 26, vamos reler o Bhagavad-Gita. Arjuna vê, formados no exército que devia combater, "seus avós, sogros, tios, irmãos e primos com seus respectivos filhos e netos, seus camaradas, professores e amigos" (I, 26 - por coincidência o mesmo número do artigo!) e assim fala:
"Ó Krishna, ao ver estes meus parentes reunidos aqui, desejosos de lutar, meus membros cedem, arde-me a boca, meu corpo tirita, meus cabelos arrepiam-se, o arco me escorrega das mãos, a pele se me abrasa. Ó Krishna, não sou capaz de manter-me, os pensamentos se me confundem, vejo maus presságios. Não aspiro a vitória, nem a reino, nem a prazeres. Mestres, tios, filhos e netos, avós, sogros, além de outros parentes - que inspiravam o desejo de império, alegria e prazeres - eles próprios estão aí, em ordem de batalha, renunciando à vida e à fortuna. Que valem, pois, reino, alegria, e mesmo a existência.
A esses guerreiros não quero matar, embora por eles seja eu morto, nem pelo domínio dos três mundos, quanto mais por causa desta Terra, ó matador de Madhu, ó Janárdana, que prazer pode advir a nós do assassínio dos filhos de Dhritarashtra? Só o erro se apossará de nós, por termos massacrado esses malfeitores. Portanto, não devemos matar esses filhos de Dhritarashtra, que são nossos parentes; como podemos nós, ó Madhava, ter felicidade destruindo nossos próprios parentes? Embora eles, dominados pela ambição, não vejam mal em destruir a família, nem erro em hostilizar amigos. Mas, ó Janárdana, por que não recuarmos deste erro, já que percebemos claramente o mal em destruir a família"? (I. 28:39).
No capítulo segundo, Krishna Esclarece Arjuna de que todos esses "entes caros" são as exterioridades transitórias e ilusórias, os veículos inferiores da personagem terrena, com seus vícios (e, por isso, destruindo-os, realmente não há prazer em reinos nem em alegrias terrenas) mas que precisamos combater para atingir- a essência intima, o Eu verdadeiro: "esses cornos são perecíveis, (II,18). Mas o Eu é "eterno, onipresente, imutável, permanente, perpétuo" (II, 39), pois é no linguajar evangélico, o "reino dos céus". A explicação é bastante clara.
"O sábio, dotado de conhecimento, abandonando o fruto de suas ações, torna-se livre dos grilhões do berço e alcança o estado que está além de todo mal. Quando teu intelecto houver atravessado o pântano da ilusão, então, e só então atingirás a indiferença em relação às coisas ouvidas e por ouvir. Quando teu intelecto, agindo pelas várias opiniões antagônicas das Escrituras, se firma inabalavelmente no Eu, então atingirás a Yoga (auto-realização ou união com Deus)" (II, 51-53)
E continua:"
"'Ó Partha, quando um homem chega a satisfazer-se apenas com o Eu pelo Eu, e baniu completamente todos os desejos da alma, então se diz que ele possui firme sabedoria. Aquele cuja alma não se agita em calamidades, e que não aspira ao poder, e que está liberto do apego, do medo e da cólera é em verdade tido como um santo de firme sabedoria. Aquele que é liberto de todo apego, e que não se rejubila ao receber o bem, nem se perturba ao receber o mal, tem sua sabedoria bem confirmada. Sua sabedoria começou a ficar bem firmada, quando ele retirou inteiramente seus sentidos dos objetos dos sentidos, como a tartaruga renuncia aos membros. O encarnado, pela prática da abstinência (não dando alimento aos sentidos), pode amortecer os sentimentos dos sentidos, mas os anseios ainda permanecem em seu coração; todos os anseios se abatem, quando tiver visto o Supremo. O filho de Kuntil, os sentidos (parentes) são perigosos, chegam mesmo a arrastar à força o espírito de um homem sensato que está lutando pela perfeição. O homem de firme sabedoria, tendo-o subjugado a todos eles (os sentidos, seus "parentes" mais caros) fica fixado em Mim, o Supremo. Aquele que tem os sentidos sob controle, tem a sabedoria bem firmada. Cuidando dos objetos dos sentidos, o homem e torna apegado a eles. Do apego nasce o anseio, e do anseio a cólera. Da cólera nasce o delírio, e este causa a perda de memória. Com esta arruina-se a faculdade de escolha, e com a ruína desta faculdade o homem perece. Mas aquele que se domina alcança a paz e circula por entre os objetos com os sentidos controlados, isento de qualquer anseio ou aversão. Na paz, cessa a infelicidade e o espírito cheio de paz em breve se firma na sabedoria. Não há sabedoria para o instável nem para o que não medita. E como poderá haver ventura para quem não tem paz? O espírito que condescende com os sentidos indisciplinados e errantes, arrasta consigo sua sabedoria, exatamente como um barco na água é arrastado pelo vento. Portanto, ó poderosamente armado, sabedoria firme é a daquele cujos sentidos estão bem afastados de todos os objetivos dos sentidos".
O ensinamento do Espirito, do Cristo, é um em todas as épocas e em todos os quadrantes, porque "há um só corpo e um só Espirito... um só Senhor, uma só fé, um só mergulho, um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, e é por todos e está em todos" (Ef. 4:3-6).
Fica, pois definitivamente explicado o sentido profundo e simbólico do verbo "odiar" neste trecho evangélico, tão incompreendido até hoje.
Mas passemos à interpretação do texto no campo iniciático.
Ainda uma vez encontramos preciosas lições de como deve preparar-se aquele que pretende ingressar na "Assembléia do Caminho", essa criação sublime de Mestre e Hierofante Divino, que veio pessoalmente instruir-nos. Vejamos as condições requeridas:
1 - Compreensão absoluta do desligamento total de tudo o que é terreno, como seu corpo, suas sensações, suas emoções, seu intelectualismo humano, com todos os seus agregados "animais", que a ele se colaram durante o percurso evolutivo pelos reinos inferiores: preguiça, sensualismo , paixões, vaidade e orgulho; de tão arraigados, com ele mesmo confundidos, são considerados "parentes consangüíneos: pai, mãe, esposa, filhos, irmãos, irmãs. Tudo o que constitui matéria, duplo etérico (sangue) e astral deve ser abandonado e como que "odiado", voltando-se o candidato na direção oposta: o "Espírito Puro". Como, de modo geral, o ambiente familiar é contrário a qualquer elevação espiritual do iniciado (e Jesus tinha experiência pessoal disso, cfr. Marc. 3:21 e 33-35), o candidato deve estar convicto de que, também; seu progresso espiritual está desligado de qualquer laço familiar, se for indispensável cortar os afetos (emoções) para dedicar-se integralmente ao Espírito. Muito mais fortes são as ligações espirituais, que as consangüíneas. A fraternidade espiritual é REAL E ETERNA, já que somos filhos do mesmo PAI ETERNO; ao passo que o parentesco sangüíneo é passageiro, de uma só encarnação, podendo, na seguinte, ser realizado em outro grupo, em outra terra, em outra raça.
2 - Entretanto, não são apenas os apegos externos que precisam ser cortados, mas até o do próprio eu pequeno, da personagem terrena transitória - o filho único tão querido - a própria "alma", com suas idiossincrasias, seus gostos, suas características temperamentais. Esse é o maior apego nosso. E não basta convencer-se disso, mas é preciso realizar (ou seja, päthein) experimentar, "sofrer" destaque total e passar a viver no Eu verdadeiro. Só realizando esses
dois desligamentos é que o candidato poderá tornar-se discípulo. E aqui mais uma vez comprovamos o emprego da terminologia técnica das escolas iniciáticas: discípulo o que põe o pé na senda para iniciar a caminhada. Só após perlustrar o discipulado em seus graus primeiros (discípulo em provação e discípulo aceito) é que pode pretender o ingresso na iniciação. E dificilmente se obtém isso numa só existência terrena. Os próprios "Mestres de Sabedoria" continuam até hoje a denominar-se a Si mesmos. "Discípulos", Daí não acreditarmos em quem se chama a si próprio de "iniciado": quem o diz, não o é; porque quem verdadeiramente é iniciado, não o diz.
3 - A terceira condição para ser discípulo aceito, é receber com alegria o peso da própria cruz, que tem vários aspectos. Inicialmente, é a própria encarnação, quando a criatura se torna consciente de que se acha "pregado" na cruz de carne, limitado em suas possibilidades, grudado ao chão de matéria. Mas, além desse peso, outros podem superpor-se: pobreza, falta de meios e de ambiente, aderentes incompreensivos, exploradores e abusadores, dores e sofrimentos, deficiências físicas humilhações e desprezos, perseguições e até morte. E, não obstante tudo isso, continuar firme o trajeto, sem abater-se nem desanimar.
4 - O passo seguinte é o de palmilhar a estrada que o Mestre exemplificou, com Sua humildade, Seu espirito de sacrifício, Sua dedicação integral ao serviço à humanidade, Sua união com o Pai, Seu amor sem condições a todos. "Vem atrás de mim" ou "segui-Lo", quando são frases proferidas pelo Cristo, significa realmente unir-se a Ele, buscá-lo por todos os meios, "mendigar o Espírito" com lágrimas, procurando "ajustar-se" com a sintonia crística, até unificação final.
5 - Para ingressar no discipulado, faz-se ainda mister capacidade cultural, a fim de bem compreender os ensaios, sem limitações nem distorções. Muitos há que desejam ardentemente ingressar como discípulos aceitos ou, até mesmo, atingir a iniciação. Inegavelmente, são, muitas vezes pessoas ardorosas de amor e ansiosas de perfeição. Mas não possuem as condições essenciais para isso, não tem conhecimento. Para iniciação são essenciais três
condições pessoais: amor, amadurecimento e sabedoria (cf. vol. 5." pág. 65):
"Jesus crescia em sabedoria, amadurecimento e amor" (Luc. 2:5; vol. 1o., pág. 106). Então, os que não conquistarem o conhecimento, e ainda precisarem dedicar-se ao estudo, não são cortados do espiritualismo: podem seguir a via devocional ou a via mística. Mas não a senda iniciática. A via devocional e a mística são linhas evolutivas pessoais, ao passo que a senda iniciática é grupal, e prepara a criatura para o magistério sacerdotal. Ora, sem cultura e
conhecimento, como se poderá ensinar? Há enorme perigo não apenas de desviar-se, mas, pior ainda, de afastar do rumo certo aqueles que neles confiam. Daí serem tão rigorosas as escolas que preparam discípulos para a iniciação na admissão de candidatos. Jesus, em diversas ocasiões - como esta agora - alerta quanto às condições indispensáveis para ingressar no discipulado: examine-se se tem capacidade intelectual desenvolvida, para que não inicie
uma obra e se veja obrigado a parar na metade do caminho.
6 - Outro requisito para entrar na Escola é saber se conseguiu vitória, ou se está capacitado para obtê-la, contra os inimigos internos e externos. Em outras palavras, se seus instintos inferiores animais não estão mais fortes que sua capacidade de luta. O "rei" (o Espírito) precisa calcular suas forças, a fim de ver se são superiores às do "outro rei" (a personagem). Se forem inferiores as forças do Espírito, este "pede as condições de paz". Isto é
exemplo) se a sensualidade predominar e o Espírito não tiver condições de sublimá-la, obedeça à força de sua personagem e se dedique à família, sem pensar em desapegar-se; se a violência do temperamento não pode ser dominada, afaste-se da senda nessa vida, e volte quando puder contar com o domínio de suas energias exuberantes. E assim por diante. Então, calcule bem suas possibilidades de luta e de vitória antes de lançar-se ao combate, a fim de não arriscar-se a derrotas espetaculares que, além de descoroçoá-la podem trazer sérios prejuízos à instituição a que se filia. Dai o rigor que os instrutores manifestam, antes de receber alguém, e o longo período probacional a que são submetidos: comprovar que superaram todos os vícios. Aqueles que ingressam na senda por sua alta recreação, de modo geral caem fragorosamente,
quer desviando-se para a magia negra, quer aniquilando-se até na parte humana: corrúptio óptimi, péssima, ou seja, a corrupção do melhor, é a pior.
7 - Finalmente é mister destacar-se de todos os bens materiais, de todas as "posses" para que não seja por elas "possuído". Deverá ser capaz de dar tudo, e passar o resto da existência a mendigar seu sustento. Ainda que isso não lhe seja exigido, no entanto deve ser capaz de fazê-lo sem sofrimento moral. Portanto, desapego total.
Essas são as regras para todas as épocas e regiões do globo, sem exceção. Como vemos, encontramos no ensino crístico a orientação completa e integral. A única necessidade é saber interpretar Suas palavras de sabedoria, e não apenas fixar-se na letra fria e morta.
Extraído do livro "Sabedoria do Evangelho" – Carlos Torres Pastorino
Segunda-feira, 5 de Setembro de 2011
Como você costuma comemorar o seu aniversário?
Quando se é criança, aniversário tem gosto de brigadeiro e sabor de brincadeiras. Espera-se o dia com muita ansiedade.
As mães já estão habituadas a responder, durante meses, a mesma pergunta: É hoje o dia do meu aniversário?
E, em verdade, embora as crianças queiram muito comemorar, para elas o mais importante são os amigos. É claro que elas adoram abrir os pacotes de presentes. Aliás, rasgam o papel com muita pressa, pois querem logo ver o que está dentro.
Elas gostam de cachorro quente, brigadeiro e sorvete. Mas, o que mais apreciam são as brincadeiras com os amigos.
Tão verdadeiro é isso que, normalmente, quem fica ao redor da mesa de doces e salgados são os adultos. A criançada está correndo no jardim, no pátio, gritando, pulando, rindo.
Costuma-se dizer que algumas datas são marcantes. O calendário terrestre estabeleceu, por exemplo, o aniversário de quinze anos como especial. Particularmente para as meninas.
Não mais que o de vinte e um anos, porque os jovens conquistam a sua liberdade. É a maioridade.
E que se dizer da marca dos cinquenta anos? Meio século de conquistas, de atividades. Idade de reflexão, de ponderação.
Na medida em que os anos vão se somando, os aniversários passam a ter outro sabor. Sabor de saudade, de lembrança, de recordações, de amigos que já não estão ao seu lado.
Há os que apreciam festas ruidosas, com música, dança e muitas pessoas ao redor. Há os que preferem comemorações mais íntimas, com os amigos mais chegados.
A atriz Jamie Lee Curtis instituiu uma tradição de aniversário envolvendo a sua mãe, a também atriz Janet Leigh.
Todos os anos, até a morte de sua mãe, em 2004, no aniversário de Jamie, ela telefonava para a mãe às oito horas e trinta e seis minutos, e imitava um obstetra:
Muito bem, Janet. Vamos. Continue a fazer força. Respire fundo. Lá vai!
Às oito horas e trinta e sete minutos, Jamie imitava o choro de um recém-nascido e agradecia à mãe por ter feito tanta força.
Toda vez, conta a atriz, sua mãe ria e chorava ao mesmo tempo.
E sempre que alguém comemora um aniversário, Jamie pergunta: Já ligou para sua mãe e agradeceu?
* * *
Todos os que estamos vivendo na Terra devemos ser muito gratos pela vida. Nosso primeiro agradecimento a Deus, que por amor nos criou.
Depois a nossos pais que nos geraram. A nossa mãe que nos embalou com sua sinfonia rítmica, mantendo-nos próximos ao seu coração, durante toda a gestação.
E depois de termos nascido, nos amamentou, cuidou, ensinou, esquecendo-se de si mesma.
Por isso, não aguarde o seu aniversário. Hoje mesmo, agora, diga para sua mãe: Obrigado, mãe, por tantas coisas, pela minha vida. Obrigado por ter me transformado nesse ser completo que vive, ama, sente, trabalha e é feliz.
Redação do Momento Espírita, com base no artigo Comemoração, de Seleções Reader's Digest, de abril de 2000.
Em 02.09.2011.
Sábado, 3 de Setembro de 2011
Pode ser interessante, para aqueles que o ignoram, conhecer a doutrina dos Judeus com respeito ao pecado original; pedimos emprestada a explicação seguinte ao jornal israelita, Ia Famille de Jacob, que se publica em Avignon, sob a direção do grande rabino Benjamin Massé; número de julho de 1868.
"O dogma do pecado original está longe de estar entre os princípios do Judaísmo. A lenda profunda que o Talmud (Nida XXXI, 2) e que representa os anjos fazendo a alma humana, no momento em que ela vai se encarnar num corpo terrestre, prestar juramento de se manter pura durante a sua estada neste planeta, a fim de retornar pura junto do Criador, é uma poética afirmação de nossa inocência primitiva e de nossa independência moral da falta de nossos primeiros pais, Essa afirmação, contida nos livros tradicionais, está conforme o verdadeiro espírito do Judaísmo.
"Para definir o dogma do pecado original, bastar-nos-á dizer que se toma pela letra o relato da Gênese, do qual se desconhece o caráter lendário, e que, partindo desse ponto de vista errado, aceitam-se cegamente todas as conseqüências que dele decorrem, sem se importar com a sua incompatibilidade com a natureza humana e com os atributos necessários e eternos que a razão reporta à natureza divina.
"Escravos da letra, afirmam-se que a primeira mulher foi seduzida pela serpente, que ela comeu de um fruto proibido por Deus, e que ela o fez comer a seu esposo, e que, por esse ato de revolta aberta contra a vontade divina, o primeiro homem e a primeira mulher incorreram na maldição do céu, não só por eles, mas por seus filhos, mas por sua raça, mas pela Humanidade inteira, para a Humanidade cúmplice por qualquer ausência da duração que ela se encontra dos culpados, cúmplice de seu crime, do qual ela é, conseqüentemente, responsável em todos seus membros presentes e futuros.
"Segundo essa doutrina, a queda e a condenação de nossos primeiros pais foram uma queda e uma condenação para a sua posteridade; desde então, para o gênero humano, os males inumeráveis que teriam sido sem fim, sem a mediação de um Redentortão incompreensível quanto o crime e a condenação que o chamam. Do mesmo modo que o pecado original de um único foi cometido por todos, do mesmo modo a expiação de um único será a expiação de todos; a Humanidade, perdida por um único, será salva por um só: a redenção é a conseqüência inevitável do pecado original.
"Compreende-se que não discutimos essas premissas com as suas conseqüências, que não são para nós mais aceitáveis do ponto de vista dogmático do que do ponto de vista moral.
"Nossa razão e nossa consciência jamais se acomodarão com uma doutrina que apaga a personalidade humana e a justiça divina, e que, para explicar as suas pretensões, nos faz viver todos juntos, na alma como no corpo, do primeiro homem, ensinando-nos que, embora numerosos que sejamos na sucessão das idades, fazemos parte de Adão em espírito e matéria, que tomamos parte em seu crime, e que devemos ter a nossa parte nessa condenação.
"O sentimento profundo de nossa liberdade moral se recusa a essa assimilação fatal, que nos tiraria nossa iniciativa, que nos acorrentaria apesar de nós num pecado longínquo, misterioso, do qual não temos consciência, e que nos faria sofrer um castigo ineficaz, uma vez que aos nossos olhos ele não seria merecido.
"A idéia indefectível e universal que temos da justiça do Criador se recusa muito mais energicamente ainda em crer no compromisso, na falta de um só, dos seres livres criados sucessivamente por Deus na seqüência dos séculos.
"Se Adão e Eva pecaram, só a eles pertence a responsabilidade de sua ação má; só a eles sua queda, sua expiação, sua redenção por meio de seus esforços pessoais para reconquistar a sua nobreza. Mas nós, que viemos depois deles, que, como eles, temos sido o objeto de um ato idêntico da parte do poder criador, e que devemos, a esse título, ser de um prêmio igual ao do nosso primeiro pai aos olhos de nosso Criador, nós nascemos com a nossa pureza e a nossa inocência, das quais somos os únicos senhores, os únicos depositários, e cuja perda ou conservação não dependem absolutamente de nossa vontade, quanto das determinações de nosso livre arbítrio.
"Tal é, sobre esse ponto, a doutrina do Judaísmo, que não poderia nada admitir que não esteja nada conforme à nossa consciência esclarecida pela razão."
B. M.
Revista Espírita Setembro de 1868
Uma carta que nos foi escrita há tempos falava do projeto de dar a uma publicação periódica o título de Jornal do Espiritismo Independente. Sendo essa o corolário da do Espiritismo sem os Espíritos, vamos, evidentemente, tentar colocar a questão no seu verdadeiro terreno.
Antes de mais, o que é o Espiritismo independente?
Independente de quê? Uma outra carta o diz claramente: é o Espiritismo liberto, não só da tutela dos Espíritos, mas de toda direção ou supremacia pessoal, de toda subordinação às instruções de um chefe, cuja opinião não pode fazer lei, considerando-se que não é infalível.
Isto é a coisa mais fácil do mundo: existe de fato, uma vez que o Espiritismo, proclamando a liberdade absoluta de consciência, não admite nenhum constrangimento em matéria de crença, nem jamais contestou a alguém o direito de crer à sua maneira em matéria de Espiritismo, como em qualquer outra coisa.
Deste ponto de vista, nós mesmos nos achamos perfeitamente independente e queremos aproveitar esta independência. Se há subordinação, ela é, pois, inteiramente voluntária; mais ainda, não é subordinação a um homem, mas a uma idéia, que se adota porque convém, que sobrevive ao homem se é justa, que cai com ele ou antes dele se é falsa.
Para nos libertarmos das idéias alheias é preciso, necessariamente, que tenhamos as nossas próprias idéias; naturalmente a gente procura fazer que estas prevaleçam, sem o que as guardaríamos para nós; proclamamo-las, sustentamo-las, defendemo-las, porque cremos sejam a expressão da verdade; porque admitimos a boa-fé, e não o único desejo de derrubar o que existe. O objetivo é congregar maior número possível de partidários; e aquele que não admite chefe se faz, ele mesmo, chefe de seita, buscando subordinar os outros às suas próprias idéias.
Aquele que diz, por exemplo: “Não devemos mais receber instruções dos Espíritos”, não emite um princípio absoluto? Não exerce uma pressão sobre os que as querem, desviando-os de as receber? Se funda uma reunião nesta base, deve excluir os partidários das comunicações, porque, se estes últimos constituíssem maioria, a tornariam lei. Se os admite e recusa obtemperar aos seus desejos, atenta contra a liberdade que têm de a reclamar. Que inscreva em seu programa: “Aqui não se dá a palavra aos Espíritos” e, então, os que desejem ouvi-los se conformarão à ordem e não se apresentarão.
Sempre dissemos que uma condição essencial de toda reunião espírita é a homogeneidade, sem o que haverá dissensão.
Quem fundasse uma na base da rejeição das comunicações estaria no seu direito; se aí só admitir os que pensam com ele, faz bem, mas não tem o direito de dizer que, porque não o quer, ninguém o deve querer. Certamente é livre para agir como entender; mas, se quer a liberdade para si, deve querê-la para os outros; já que defende suas idéias e critica as dos outros, se for conseqüente consigo mesmo, não deve achar ruim que os outros defendam as suas e critiquem as dele.
Geralmente muitos esquecem que, acima da autoridade do homem, outra há, à qual quem quer que se faça representante de uma idéia não pode subtrair-se: é a de todo o mundo. A opinião geral é a suprema jurisdição, que sanciona ou derruba o edifício dos sistemas; ninguém pode livrar-se da subordinação que ela impõe.
Esta lei não é menos onipotente no Espiritismo. Quem quer que fira o sentimento da maioria e a abandone deve esperar ser por ela abandonado. Aí está a causa do insucesso de certas teorias e de certas publicações, abstração feita do mérito intrínseco destas últimas, sobre a qual por vezes se tem ilusão.
Não se deve perder de vista que o Espiritismo não está submetido a um indivíduo, nem a alguns indivíduos, nem a um círculo, nem mesmo a uma cidade, mas que seus representantes estão no mundo inteiro e que entre eles há uma opinião dominante profundamente acreditada; julgar-se forte contra todos, porque se tem o apoio de seu grupo, é expor-se a grandes decepções.
Há duas partes no Espiritismo: a dos fatos materiais e a de suas conseqüências morais. A primeira é necessária como prova da existência dos Espíritos, de modo que foi por ela que os Espíritos começaram; a segunda, dela decorrente, é a única que pode levar à transformação da Humanidade pelo melhoramento individual. O melhoramento é, pois, o objetivo essencial do Espiritismo. É para ele que deve tender todo espírita sério. Tendo deduzido essas conseqüências das instruções dos Espíritos, definimos os deveres que impõe esta crença; o primeiro deles inscrevemos na bandeira do Espiritismo: Fora da caridade não há salvação, máxima aclamada, em seu aparecimento, como a luz do futuro, e que logo deu a volta ao mundo, tornando-se a palavra de ligação de todos quantos vêem no Espiritismo algo mais que um fato material. Por toda parte foi acolhida como o símbolo da fraternidade universal, como penhor de segurança nas relações sociais, como a aurora de uma nova era, onde devem extinguir-se os ódios e as dissensões. Compreende-se tão bem a sua importância, que já se colhem seus frutos; entre os que a tomaram como regra de conduta, reinam a simpatia e a confiança, que fazem o encanto da vida social. Em todo espírita de coração vê-se um irmão com o qual a gente se sente feliz de encontrar, porque sabe que aquele que pratica a caridade não pode fazer nem querer o mal.
Foi, pois, por nossa autoridade privada que promulgamos esta máxima? E ainda que o tivéssemos feito, quem poderia encontrá-la má? Não; ela decorre do ensino dos Espíritos, e eles mesmos a colheram nos do Cristo, onde está escrita com todas as letras, como pedra angular do edifício cristão, mas onde ficou enterrada durante dezoito séculos. O egoísmo dos homens não se dispunha a fazê-la sair do esquecimento e torná-la explícita, porque teria sido pronunciar sua própria condenação; preferiram buscar sua própria salvação nas práticas mais cômodas e menos desagradáveis.
E, contudo, todo o mundo havia lido e relido o Evangelho e, com pouquíssimas exceções, ninguém tinha visto esta grande verdade relegada a segundo plano. Ora, eis que, pelo ensino dos Espíritos, ela se tornou subitamente conhecida e compreendida por todos.
Quantas outras verdades encerra o Evangelho e que surgirão a seu tempo! (O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo XV).
Inscrevendo no frontispício do Espiritismo a suprema lei do Cristo, nós abrimos o caminho do Espiritismo cristão; temos, pois, motivos para desenvolver os seus princípios, bem como os caracteres do verdadeiro espírita sob esse ponto de vista.
Que outros possam fazer melhor que nós; não iremos contra, porque jamais dissemos: “Fora de nós não há verdade.”
Nossas instruções, pois, são para os que as acham boas; são aceitas livremente e sem constrangimento; traçamos uma rota e a segue quem quer; damos conselhos aos que no-los pedem, e não aos que julgam deles não precisar; não damos ordens a ninguém, pois não temos qualidades para tanto.
Quanto à supremacia, ela é toda moral e na adesão dos que partilham nossa maneira de ver; não estamos investidos, mesmo por aqueles, de nenhum poder oficial; não solicitamos nem reivindicamos nenhum privilégio; não nos conferimos nenhum título, e o único que tomaríamos com os partidários de nossas idéias é o de irmão em crença. Se nos consideram como seu chefe, é devido à posição que nos dão nossos trabalhos, e não em virtude de uma decisão qualquer. Nossa posição é a que qualquer um de nós poderia tomar antes de nós; nosso direito, o que tem todo mundo de trabalhar como entende e de correr o risco do julgamento do público.
De que autoridade incômoda entendem libertar-se os que querem o Espiritismo independente, uma vez que não há poder constituído nem hierarquia vedando a porta a quem quer que seja, e levando-se em conta que não temos sobre eles nenhuma jurisdição e que, se lhes aprouver afastar-se de nossa rota, ninguém poderá constrangê-los a nela entrar? Alguma vez já nos fizemos passar por profeta ou messias? Levariam eles a sério os títulos de sumo-sacerdote, de soberano pontífice, mesmo de papa, com que a crítica se deleitou em nos gratificar? Não só jamais os tomamos, como os espíritas jamais no-los deram. – É do ascendente de nossos escritos? O campo lhes está aberto, como a nós, para cativarem a simpatia do público. Se há pressão, ela não vem de nós, mas da opinião geral que põe o seu veto naquilo que não lhe convém e porque ela própria sofre o ascendente do ensino geral dos Espíritos. É, pois, a estes últimos que, em última análise, se deve atribuir o estado de coisas, e é talvez o que faz que não mais os queiram escutar. – É das instruções que damos? Mas ninguém é forçado a se submeter a elas. – Devem lamentar-se de nossa censura? Jamais citamos alguém, a não ser para elogiar, e nossas instruções são dadas sob forma geral, como desenvolvimento de nossos princípios, para uso de todos. Se, aliás, são más, se nossas teorias são falsas, em que isto os pode ofuscar? O ridículo, se ridículo há, será para nós. Levam tão a sério os interesses do Espiritismo, que temem vê-los periclitar em nossas mãos? – Somos absolutos demais em nossas idéias? Somos um cabeça dura com quem nada se pode fazer? Ah! meu Deus! cada um tem os seus pequenos defeitos; temos o de não pensar ora branco, ora preto; temos uma linha traçada e dela não nos desviaremos para agradar a quem quer que seja. É provável que sejamos assim até o fim.
É nossa fortuna que invejem? Onde os nossos castelos, as nossas equipagens e os nossos lacaios? Certamente, se tivéssemos a fortuna que nos atribuem, não seria dormindo que ela teria vindo e muitas pessoas amontoam milhões, num labor menos rude. – Que fazemos, então, do dinheiro que ganhamos? Como não pedimos contas a ninguém, a ninguém temos que as dar; o que é certo é que não serve para os nossos prazeres. Quanto a empregar para pagar agentes e espiões, devolvemos a calúnia à sua origem.
Temos que nos ocupar com coisas mais importantes do que saber o que faz este ou aquele. Se fazem bem, não devem temer nenhuma investigação; se fazem mal, isso é lá com eles. Se há os que ambicionam a nossa posição, é no interesse do Espiritismo ou no deles? Que a tomem, pois, com todos os seus encargos, e provavelmente não acharão que seja uma sinecura tão agradável quanto supõem. Se acham que conduzimos mal o barco, quem os impedia de tomar o leme antes de nós? e quem os impede ainda hoje? – Lamentam-se de nossas intrigas para fazermos partidários?
Nós esperamos que venham a nós, pois não vamos procurar ninguém; nem sequer corremos atrás dos que nos deixam, porque sabemos que não podem entravar a marcha das coisas; sua personalidade se apaga diante do conjunto. Por outro lado, não somos bastante presunçoso para crer que seja por nossa pessoa que se ligam a nós; evidentemente é pela idéia de que somos o representante. É, pois, a esta idéia que reportamos os testemunhos de simpatia que hão por bem nos dar.
Em suma, o Espiritismo independente seria aos nossos olhos uma insensatez, porque a independência existe de fato e de direito e não há disciplina imposta a ninguém. O campo de exploração está aberto a todos; o juiz supremo do torneio é o público; a palma é para quem sabe conquistá-la. Tanto pior para os que caem antes de atingir a meta.
Falar dessas opiniões divergentes que, em última análise, se reduzem a algumas individualidades, e em parte alguma formam corpo, não será, talvez digam algumas pessoas, ligar a isto muita importância, assustar os adeptos fazendo-os crer em cisões mais profundas do que realmente o são? Não é, também, fornecer armas aos inimigos do Espiritismo?
É precisamente para prevenir esses inconvenientes que disto falamos. Uma explicação clara e categórica, que reduz a questão ao seu justo valor, é mais adequada para assegurar do que para amedrontar os adeptos; eles sabem como proceder e aí encontram argumentos para a réplica. Quanto aos adversários, já exploraram o fato muitas vezes, e foi por terem exagerado o seu alcance que é útil mostrar como a coisa funciona.
Revista Espírita de Abril de 1866